Personagens de uma histórica reaproximação entre duas culturas

De aluna em intercâmbio a intérprete do presidente e histórias de um descendente "desligado"
sábado, 16 de fevereiro de 2019
por Girlan Guilland (girlan.guilland@gmail.com)
Desfile dos 200 anos (Arquivo AVS)
Desfile dos 200 anos (Arquivo AVS)

Atualmente, professora de idiomas (inglês e francês), guia de turismo e secretária da Associação Fribourg-Nova Friburgo e da Casa Suíça, Elisabeth de Castilho era aluna da Aliança Francesa, em 1996, quando foi convidada a auxiliar na recepção à comitiva suíça do IV Encontro.

Tendo ficado encarregada de um dos ônibus das autoridades, Elisabeth relembra o que considera “uma experiência sensacional para uma estudante da língua francesa, poder praticar e vivenciar o idioma”.

- Desde o primeiro momento, participei ativamente, procurando contribuir com todos e da melhor forma. São experiências importantes, que fazem parte da minha vida e ajudaram a nortear minha profissão.

Dois anos após, em 1998, ela participou do primeiro intercâmbio linguístico da Aliança Francesa de Nova Friburgo: “Fomos à Suíça e ficamos hospedados em casas de famílias locais. Tive oportunidade de fazer estágios profissionais e foi bastante proveitoso”.

A professora é outra que destaca a emoção como um componente forte desses anos. “Em todos os encontros, a emoção está presente: seja no reencontro das famílias ou pela descoberta dos laços unindo Nova Friburgo e Fribourg. Muitos suíços vêm pela primeira vez à América do Sul e ficam impressionados com a exuberância do nosso país; percebem que nem sempre o que é transmitido pela mídia é tão catastrófico. Muitos voltam, conhecem melhor nosso país, sempre mantendo contato com os amigos (as) e descendentes friburguenses.

Nestas pouco mais de duas décadas, Elisabeth tem muitos momentos especiais para rememorar: além da ida à Suíça, pela primeira vez, em 1998, depois, para a Expo 2002, “chegar de barco à Estavayer-le-lac, na ‘viagem de volta’ e participar dos eventos foi muito enriquecedor”!

Mas foi ano passado, durante a programação do bicentenário que ela viveu um de seus maiores momentos: “Atuar como intérprete do Sr. Dominique De Buman, (presidente da Câmara Federal do país), a quem conheci em 1996, no IV Encontro, foi muito emocionante”.

Ela conta que De Buman já atuava na política e depois se encontraram em 2002, na Suíça, quando ele era prefeito de Fribourg. “Reencontrá-lo foi uma experiência impressionante. Primeiro, eu era estudante e, depois, sua intérprete aqui na nossa cidade! O ano do bicentenário de Nova Friburgo, nos proporcionou viver momentos intensos. Estar entre as autoridades brasileiras e suíças me permitiu perceber que, de fato, somos todos irmãos: brasileiros, suíços, africanos, portugueses, libaneses, espanhóis, italianos, húngaros, austríacos, japoneses, todas as nações”.

Com vivência adquirida ao longo desse tempo, a professora vislumbra uma “nova oportunidade de intercâmbio com a Suíça, em diversos setores e que deve ser bem aproveitada”.

"As autoridades suíças ficaram muito bem impressionadas com a cidade, com a economia, com as belezas naturais e com a forma calorosa com que foram recebidos em todos os lugares aqui em nossa cidade".

Para ela, “alguns momentos marcantes foram o show de abertura no Country Clube e o desfile de 16 de maio, quando puderam sentir a força da nossa população”.

"Considero esta data importante para a união e o respeito entre nossos povos. Mundialmente, vivemos momentos conturbados, mas o respeito às diferentes culturas e formas de ver o mundo, se faz necessário e essencial à preservação de nossa espécie (humana, animal e vegetal). Este ano celebramos a chegada dos suíços à nossa cidade. Um dos projetos da Associação Nova Friburgo - Fribourg é a viagem de "volta", comemorativa também dos 200 anos. Nós estamos nos organizando aqui, e a Associação Fribourg-Nova Friburgo está organizando as comemorações lá, em 4 de julho. Mais uma oportunidade de reforçarmos os nossos laços".

De descendente "desligado" a 90% de dedicação

“Eu era mais um descendentes que não tinha ligação direta com a cultura suíça. Mas após me aposentar, voltei do Rio e iniciei a cooperação na Associação da Família Thurler. Depois, fui ajudar a Jaqueline, filha do Sr. Renê”. (Pegataiz, ex-presidente da Colônia Suíça, na cidade).

Assim se auto define Geraldo Thurler. Ex-estudante de psicologia, que acabou se formando em engenharia mecânica civil. “Ainda exerço a profissão em contratos pontuais. Mas 90% do meu tempo é dedicado às atividades sociais, culturais e educacionais”. Atualmente, Geraldo é o presidente da seção brasileira da associação intercambiária, com sede em Nova Friburgo, e nestes últimos dias está envolvido com a inauguração da nova sala com painel temático na Praça das Colônias, no Suspiro.

Passando a ser grande entusiasta do movimento de intercâmbio, Thurler conta que veio se esforçando pelas comemorações do Dia Nacional da Suíça e o Festival do Chocolate, “em continuidade ao trabalho iniciado pelo senhor Renê, que foi de grande valor para a colônia”.

Geraldo lembra ainda que iniciou por necessidade, o trabalho com um grupo de dança folclórica: "Fizemos diversas tentativas, a partir de 2010, com a Secretaria de Cultura, com vários professores de dança, em diferentes momentos. Mas não rolou. Eu e minha esposa, fazíamos dança de salão e decidimos, nós mesmos, assumir o desafio e hoje somos nove casais. É uma atividade muito gratificante, está aberto à comunidade e é gratuita".

O Agosto Suíço

Realizado anualmente, no oitavo mês do ano (em comemoração ao Dia Nacional da Suíça, 01/8), o Agosto Suíço é outra persistência de Geraldo. “Sentimos necessidade de tornar as datas, um calendário permanente; por exemplo, o Festival do Chocolate era decidido em cima da hora, em um final de semana de agosto. Estabelecemos que ocorreria no primeiro final de semana de agosto. A partir de então, só fez crescer”, diz Geraldo, avaliando ainda que o Agosto Suíço foi uma consequência natural, “ao nos aproximarmos do Consulado, onde solicitamos que a cidade fosse incluída em toda turnê de atividades artísticas/culturais (bandas, exposições, mostra de cinema, dança folclórica), culminando na programação de 2018, pelo bicentenário”.

Um exemplo vivo para o Brasil e para o mundo

Psicóloga e artista plástica, Madalena Bento de Mello é uma das filhas de Ariosto, um dos pais da irmanação entre as duas cidades.

Em maio do ano passado, ela e dois (Cecília e Carlos) de seus outros cinco irmãos participaram da inauguração do monumento do artista Felga de Moraes em homenagem ao pai, na avenida que leva o seu nome, no centro da Cidade.

Antes disso, Madalena participou do desfile do 200º aniversário da cidade, juntamente com a delegação suíça (Casa Suíça, Colônia e Associação), representando a Família de Ariosto, oportunidade em que reencontrou o historiador Martin Nicoulin, um momento também emocionante.

“Nosso pai Ariosto, transbordou sua luz, inundou corações, diluindo fronteiras entre pessoas e povos; semeou a semente da irmandade, fez brotar a fé, eterna colheita de beatitude”, professa Madalena para quem, “no seu 41º aniversário, a Associação Fribourg – Nova Friburgo, que seu pai idealizou e ajudou a fundar, “é hoje exemplo vivo para o Brasil e para o mundo de como conquistar a paz e de como viver na alegria do exercício do verdadeiro amor”.

“O povo fribuguense está de parabéns!

Nova Friburgo representa para o Brasil, realmente muito; nós conseguimos hoje no campo das relações internacionais, prestar um grande serviço ao Brasil, e eu diria até... ao mundo. É assim que se conquista a paz. Viva Nova Friburgo, viva a Suíça e viva o Brasil!

(...) Nas lágrimas que não conseguimos conter, no momento da paz, na missa de hoje; tenho a impressão que é a tradução desse entusiasmo que vai no coração de todos os friburguenses, neste momento em que estamos aqui na Alberto Braune, jogando essas pétalas de rosas sobre nossos irmãos suíços que se vão, mas levando nossos corações”.

Ariosto Bento de Mello, em depoimento gravado ao repórter Humberto Marchon Fontão (Rádio Sociedade Friburgo, em novembro de 1977)

Raízes fortes nas redes sociais

Descendente tanto de suíços, quanto de alemães, a funcionária da Justiça Federal do Rio de Janeiro (TRF2), Solange de Souza Barbosa, não tinha ideia do que estava por vir, quando se decidiu buscar as raízes de sua descendência dos pioneiros imigrantes.

Pesquisadora, apaixonada por história, a graduada em Economia e Direito, tradutora de filmes, a assistente jurídica Solange, encontraria mais do que simples passatempo. Ela praticamente se tornou uma genealogista autodidata e se lançou a uma aventura nas redes sociais, ao criar em 2017, a página Raízes Suíças – Nova Friburgo.

Com mais de 2.180 seguidores no Facebook, a página se tornou a verdadeira sala de estar de dezenas de famílias de descendentes, que buscam informações sobre suas ascendências e descendências.

Ao se encantar pelo tema dos mais importantes, não só para ela e sua família, mas para milhares de pessoas e de famílias de descendentes, Solange acaba nos revelando um outro excelente potencial a ser aproveitado, no contexto histórico- cultural e turístico do movimento de intercâmbio, o das associações de famílias.

Encontros familiares em Nova Friburgo e região a partir da década de 1980, a exemplo dos Thurler, Wermelinger, Schuenck, Heringer, Ouverney, Gripp e diversos outros clãs, são oportunidades de se disseminar a história, cultura, tradições e costumes desses povos, ao mesmo tempo ajudando a divulgar o potencial das cidades.

A rica história friburguense precisa de mais pessoas apaixonadas, melhor ainda, descendentes das famílias de pioneiros imigrantes, que ajudaram a escrever tantos capítulos, que podem e devem ainda acrescentar muito mais conteúdo para as futuras gerações.

 

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TAGS: 200 anos
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