Janela das Andorinhas: um lugar bonito por natureza que merecia ser mais cuidado

A localidade, que se tornou nacionalmente conhecida devido à saga dos irmãos necrófilos, sofre com o abandono das autoridades
quinta-feira, 14 de março de 2013
por Dalva Ventura
Janela das Andorinhas: um lugar bonito por natureza que merecia ser mais cuidado
Janela das Andorinhas: um lugar bonito por natureza que merecia ser mais cuidado

O nome não podia ser mais bonito. Janela das Andorinhas. E o lugarejo, bucólico, cercado de verde e ar puro, tinha tudo para ser um paraíso. Longe? Nem tanto, se a estrada não fosse de chão e não estivesse toda esburacada. 

A localidade fica em Riograndina, 2º distrito do município, cerca de 40 minutos do centro da cidade e não é à toa que ganhou este nome. Todos os dias, ao amanhecer e no fim da tarde, bandos de andorinhas sobrevoavam as duas grandes montanhas que cercam o vilarejo. Os moradores garantem que isso ainda acontece, uma coisa linda. 

Não sem razão, os moradores nem pensam em sair de lá. E os poucos que saem, acabam retornando. Foi o caso da lavradora Maria Celeste Chermont, que já se mudou duas vezes—uma delas quando os necrófilos aterrorizavam o povo de lá—mas voltou. “O lugar aqui é bom demais, dona, bom demais”. 

Apesar das dificuldades e da distância, da buraqueira e da precariedade da infraestrutura, cerca de cem famílias residem no local e a maior parte de seus integrantes se dedica à agricultura. Terra fértil, na Janela das Andorinhas em se plantando tudo dá. Mas é mesmo o caqui a principal fonte de subsistência da população. Agora está se aproximando a temporada do caqui e as árvores estão cobertas de frutas que em pouco tempo estarão prontas para a colheita.      

A Janela das Andorinhas, que se tornou conhecida nacionalmente pela saga dos “irmãos necrófilos”, nada tem de violenta. Pelo contrário. É um lugar pacífico, onde todo mundo se conhece e se ajuda. O ponto de encontro é o Bar e Sauna do Hélio e, ao lado, o Mercadinho São Jorge, ambos pertencentes a Hélio Fonseca, um autêntico líder comunitário, sem tirar nem pôr. 

Foi ele quem cedeu o terreno e ali construiu o campinho de futebol. Junto com o cunhado, Ocimar Alves Teixeira, organiza a Copa Comunitária Janela das Andorinhas e dá a maior força ao time local, o Bengalinhas Futebol Clube. Que, diga-se de passagem, ganha todos ou quase todos os campeonatos. “Na moral”, diz. A prova são as dezenas de troféus que ficam ali no armazém, em lugar de destaque e que são o orgulho da comunidade.  

Estradas esburacadas e escuridão nas ruas 

Muitos lavradores cultivam flores, mas nem tudo são flores por lá. O principal problema, não tem dúvida, são as estradas, que estão, realmente, em petição de miséria. A RJ-148, que liga Nova Friburgo a Sumidouro, está um tapete. A partir da entrada para a localidade, porém, o cenário é outro. São, no máximo, três quilômetros, que poderiam ser percorridos em pouquíssimos minutos. Mas os trechos asfaltados são raríssimos, se é que ainda se pode chamar aquilo de asfalto. Os carros são obrigados a passar em cada cratera que não tem tamanho. O resto é terra batida que, quando chove, vira um lamaceiro só.   

Detalhe: o mato que cresce à beira das estradas são os moradores que tiram. Se não fossem eles, o matagal já tinha tomado conta. O riacho que serve à comunidade também precisa ser dragado, pois quando chove, invariavelmente, acaba transbordando. Dá para deduzir como os moradores sofreram por ocasião da enchente. Que, assim como aconteceu em quase toda a área rural do município, destruiu plantações, arruinou colheitas e causou um enorme prejuízo à população. Isso sem falar no desabamento de encostas que deixou muita gente desabrigada. Até hoje muitas casas estão interditadas.      

Sem falar nas pontes que dão acesso ao local. Pontes? Eu disse pontes? Bem, não passam de pinguelas escoradas com pedras, onde até carros passam com dificuldade e os ônibus e caminhões se equilibram. Ninguém merece. 

Por falar em ônibus, os moradores nada têm a reclamar do serviço. Circulam seis vezes por dia, mais ou menos no horário e está de bom tamanho.   

Com a tragédia de 2011, o acesso à Janela das Andorinhas não pôde mais ser feito através da Ponte dos Ingleses, também conhecida como “Ponte de Ferro”, localizada na Fazenda da Laje, em Conselheiro Paulino. Os moradores lamentam, pois o escoamento da produção de caqui e hortaliças ficou bastante prejudicado, já que agora o percurso é pior e mais curto. Reconhecem que a construção de uma ponte no local será uma das últimas prioridades do governo, mas... nunca se sabe, não é? Faz uma falta danada ao pessoal de lá.

Reclamação mesmo, além das estradas, é a que diz respeito à iluminação pública. Trechos inteiros no breu total, quem aguenta? A confeccionista Nilda Carreiro de Freitas faz coro com os demais moradores e não pede, “implora” à prefeitura que ilumine as estradas da localidade. Em alguns trechos, lembra, basta a simples substituição das lâmpadas. “Será que isso é tão difícil?”, pergunta. 

Para se comunicar com o mundo, os moradores têm se valer dos telefones fixos, assim mesmo com dificuldade porque funciona mal e porcamente. Orelhão? Os poucos que existiam já foram destruídos. Celular? Quem dera! E televisão só com parabólica, coisa que muitos lavradores não têm dinheiro para comprar. Por isso mesmo, a tevê instalada no armazém e também no bar/sauna do Hélio é o recurso de que muita gente se vale para assistir o jogo de futebol e os programas de domingo.  

 As crianças frequentam a Escola Municipal Luiz Fonseca, até o 5º ano do Ensino Fundamental. Sem reclamações. As professoras são boas, a merenda, idem. Tudo bem. Os problemas só acontecem depois, quando têm de se decidir entre continuar os estudos em Conselheiro Paulino ou ajudar os pais na lavoura. 

Como no resto do país, o povo da Janela das Andorinhas também é muito religioso. E, como no resto do país também, as igrejas evangélicas estão ganhando cada vez mais terreno por lá. Os cristãos contam, inclusive, com uma igrejinha, a Congregação Cristã do Brasil. Já as missas do Mosteiro de Santa Cruz o pessoal da comunidade não costuma frequentar, até porque são rezadas em latim e mulheres só entram de saia. Até a Capela de São Jorge ficar pronta, elas são celebradas no galpão onde funciona a Associação de Moradores construída ao lado do campinho de futebol, em terreno doado—adivinha por quem?—por Hélio, claro.  

Como dá para perceber, a vida da comunidade gira em torno do Hélio, uma espécie de “prefeito” do lugar, mas que não quer nada com política. Ele herdou esta liderança do pai, seu Luiz Fonseca, que hoje é nome da escola local. Os membros da família seguiram seu exemplo e são também bastante envolvidos com o bem-estar da comunidade. O presidente da associação de moradores, Aderaldo Ferraz, é primo de Hélio, o cunhado, Ocimar Alves Teixeira, é o secretário.  Pena que nenhum dos dois estava por lá no dia em que a reportagem visitou a localidade. Mas são eles, junto com Hélio, que cuidam de tudo ali. 

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TAGS: A Voz dos Bairros | Janela das Andorinhas
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