Casarão tombado da Vila Amélia foi colocado à venda

Afape quer pagar dívidas e questiona valor histórico. Prefeitura diz que características têm que ser mantidas
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018
por Dayane Emrich
Casarão tombado da Vila Amélia foi colocado à venda

Quem passa pelo casarão da Vila Amélia, onde por décadas funcionou a 151ª Delegacia de Polícia, vê a longa faixa pendurada na fachada anunciando: “vende-se”. O imóvel pertence à Associação Friburguense de Amigos e Pais do Educando (Afape), que passa por dificuldades financeiras. O presidente, Iomar Pinheiro Penza Filho, tem pressa para vender o prédio para pagar dívidas e realizar investimentos. “Precisamos desse dinheiro para não fechar a instituição. Se não conseguirmos vendê-lo, até o meio do ano provavelmente fecharemos as portas por conta de dívidas que somam mais de R$ 400 mil”, afirma.

A prefeitura informou que o casarão foi tombado pelo município em 2009, mas, sendo um bem privado, pode ser vendido. Entretanto, o novo proprietário deverá seguir as normas de conservação em obras futuras, conservando a integridade do imóvel.

O presidente da Afape, no entanto, questiona o tombamento. Ele alega que nunca viu documentos comprovando o valor histórico do casarão e que o tombamento desvaloriza o negócio, já que o prédio nunca poderá ser demolido. Iomar explica que tentará fazer um acordo com os possíveis compradores para que o imóvel seja preservado. “A ideia é que o comprador utilize apenas o terreno ao lado do casarão e/ou mantenha, pelo menos, a fachada”, diz ele.

Conforme reportagem publicada por A VOZ DA SERRA em setembro passado, Iomar solicitou à Fundação Dom João VI e à prefeitura documentos que comprovem que o imóvel foi tombado e foi informado que o processo se perdeu na tragédia de 2011. “A verdade é que eles não têm documentos que comprovem que o casarão foi tombado. Mesmo que os documentos tenham se perdido, é necessário o estudo que confirma o valor histórico do mesmo”, argumenta.

De qualquer forma, segundo Iomar, não há razões que justifiquem o tombamento do imóvel. “Pesquisei sobre a história da casa e ninguém importante morou lá. Era uma fazenda e um chalé, ou seja, não tem relevância nenhuma. Não existem motivos para que este casarão seja tombado”, pontuou ele, explicando que juntos, a construção e o terreno, estão avaliados em R$ 3,5 milhões sem o tombamento. “Por causa dessa indefinição, estamos pedindo R$ 2 milhões, valor bem menor do que vale”, diz, revelando que já há três interessados.

A prefeitura esclareceu que a importância do casarão está na qualidade da composição de sua fachada, “cuja harmonia decorre da correta relação entre as suas diversas partes, do equilíbrio entre os elementos, (...) fachada assimétrica, pé direito alto, varanda frontal, vitral em sua escadaria, múltiplas entradas, telhado com várias águas, acabamentos com formas e padrões decorativos, fachadas cheias de ângulos, porções de alvenaria aparente, sótão, mansardas e pintura vibrante”, descreve a nota oficial. O governo destacou ainda que o imóvel está protegido pela lei municipal 3.794 de 25/11/2009 que dispõe sobre o tombamento, por interesse histórico-cultural, dos bens situados no município de Nova Friburgo.

Enquanto isso, o famoso casarão da Vila Amélia só se deteriora. Um tapume evita que o imóvel seja invadido e vandalizado, mas infiltrações tomam conta do prédio. Na sacada do segundo andar, a água da chuva empoça e transforma-se em criadouro de mosquitos. Isso sem falar da vegetação crescida e a falta de limpeza no espaço.

Entenda o caso

Durante cinco décadas, o casarão foi alugado pelo governo do estado para abrigar a delegacia de Polícia Civil e a carceragem. Em dezembro de 2001, a fim de atender à requisição da Promotoria de Proteção aos Interesses Difusos e Direitos Coletivos, foi realizada uma perícia no espaço para auxiliar na remoção da cadeia do município, que funcionava junto a delegacia. As instalações foram condenadas pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli e o imóvel foi devolvido à Afape.

Em 2012, a delegacia foi transferida para uma nova sede no bairro Vila Nova e, desde então, a Afape busca um destino para o casarão. A entidade protocolou na prefeitura um pedido de autorização para demolir o imóvel, o que iniciou um debate sobre o valor histórico do prédio.

Naquele mesmo ano, técnicos do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura e diretores da Afape vistoriaram o casarão e atestaram sua grande importância histórica. Na avaliação foram enumeradas várias características da construção do casarão que o fazem patrimônio histórico, como o vitrô junto às escadarias de madeira, janelas com venezianas de quase dois metros, sacadas e varandas.

A história

Em artigo publicado em setembro de 2017 em A VOZ DA SERRA, a historiadora friburguense Janaína Botelho conta que a residência da chácara da Vila Amélia foi tombada provisoriamente pela prefeitura municipal e que, no passado, era conhecida como a chácara do português Antônio Pinto Martins.

Segundo ela, Antônio veio para o Brasil aos 11 anos, mas apenas aos 52, em 1914, decidiu residir com a família em Nova Friburgo.  Ele comprou  o imóvel da família Salusse, conhecido como Sítio do Relógio. Explorou comercialmente a chácara e construiu o Mercado Villa Amélia, onde vendia laticínios. A residência, então, ficou conhecida como “mansão da Villa Amélia”. A única menina entre os sete filhos homens, Amélia, nascida em 1898, deu nome a vila.

Em 1968 o prefeito Amâncio Mário de Azevedo doou à Afape o terreno da Rua Souza Cardoso onde fica a quadra localizada em frente ao Mercado da Vila Amélia. Em novembro de 1982—ou seja, 14 anos depois—o prefeito Alencar Pires Barroso e a Afape fizeram uma permuta, trocando este terreno por um outro, na Rua Teresópolis, ao lado do Sesi, que estava cedido ao governo do estado para abrigar a 151ª DP, a carceragem e outras dependências da Secretaria de Segurança Pública. A partir daí, o estado passou a pagar aluguel à Afape.

Sobre a Afape

Localizada na Avenida José Pires Barroso (Via Expressa), em Olaria, a Afape foi fundada em 15 de setembro de 1962 e surgiu de uma iniciativa da educadora Olga Magliano Bastos. Seu objetivo era oferecer atendimento a crianças com deficiência ou necessidades educacionais especiais de várias faixas etárias, promovendo a inclusão social e transformando-os em cidadãos conscientes e atuantes.

Atualmente, a instituição atende 406 crianças e, para isso, conta com uma equipe multidisciplinar, formada por 36 profissionais, entre eles: psicólogos, fisioterapeutas, instrutores e professores de informática, esportes, dança e música. Mais informações sobre a entidade podem ser obtidas pelo telefone (22) 2522-8608.

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