Carlos Campanucci: “Enquanto houver uma criança, haverá circo”

Palhaço friburguense fala sobre os desafios da arte circense nos dias de hoje
quinta-feira, 28 de março de 2019
por Ana Borges (ana.borges@avozdaserra.com.br)

Ele tem 62 anos de idade, 50 de carreira no circo. E mais anos de atividades, ainda que nos bastidores, virão, enquanto ele viver. De acordo com o artista circense friburguense, Carlos Campanucci, o artista se alimenta de arte, é uma paixão que não acaba, que “nos acompanha, até o fim”. E mais: “Enquanto houver uma criança, haverá circo”, defende.

O Dia do Circo, festejado a cada 27 de março, homenageia o palhaço Piolin - Abelardo Pinto, que comandou o circo Piolin por mais de 30 anos. Seu pai era dono de circo quando Abelardo, ainda criança, aprendeu a tocar violino, a fazer contorcionismos e acrobacias. A data se refere ao seu nascimento, em 1897, em Ribeirão Preto, no estado de São Paulo.

Em homenagem aos artistas desse entretenimento que se mantém ativo graças à dedicação e perseverança dessa trupe que não desiste, entrevistamos o acrobata, trapezista e professor-multitarefa friburguense Carlos Campanucci. Tal como o Piolin, Carlos também é filho de dono de circo e começou a carreira com o pai: era e é um faz-tudo sob a lona, inclusive criando e aperfeiçoando equipamentros - hoje fabrica até monociclos - para acrobatas e malabaristas. E formado pela Escola Nacional de Circo.

“Sou de uma geração de artistas em que todo mundo tinha que fazer de tudo, aprender a se virar para resolver os problemas que surgiam, a cada espetáculo. Não havia estrutura nem leis regulando como tinha que ser o exercício da nossa profissão. Meu pai tinha o Royal Dunbar Circus e era com ele que a gente viajava pelo Brasil. A base de um circo é a acrobacia, o trapézio, e a gente tinha que praticar muito, treinar para estar pronto para fazer o que fosse necessário. Assim como eu tive que dominar o medo que a gente sente quando começa, ensino para os meus alunos como a gente faz para domar essa sensação”.   

Nada acaba, muda pra melhor

Aos 20 anos, Carlos foi para o Rio, ao encontro de uma turma de artistas que marcava ponto na Praça 11 (Centro). Ali iniciou uma nova fase, ao ser contratado pelo Circo Norte América, como acrobata e trapezista. Dali em diante trabalhou em cerca de 30 companhias, rodando todo o país. Segundo ele, há hoje cerca de cinco mil circos atuando nos quatro cantos do Brasil.  

“Só quem é do meio sabe disso. Em São Paulo há uns dois mil circos, entre grandes e médios, e uns três mil, menores, no Norte e Nordeste. Mesmo assim, tenho colegas que acham que o circo está acabando. Isso é falta de conhecimento. A história do circo é a seguinte: ele não nasceu em Roma, nas arenas onde gladiadores e animais ferozes se enfrentavam. Aquilo não era arte circense, era massacre. O circo nasceu, muito antes, na China, dos antigos guerreiros. E a primeira atividade que os chineses criaram, foi a acrobacia, que era usada como treinamento do exército chinês. Vou dizer uma coisa: nada acaba, apenas muda pra melhor”, avalia.  

Segundo ele, sendo a China uma sociedade fechada, seus governantes nunca se interessaram em mostrar ao mundo as habilidades conquistadas, ao contrário, escondiam, já que usavam a acrobacia como forma de defesa e ataque na guerra. Assim, abriram espaço para a divulgação de outra nação que viria se destacar em todo o mundo: o Circo de Moscou. “Dele saíram grandes acrobatas, como o ator russo Kirk Douglas, que fez fama em Hollywood, e tantos outros, que imigraram para vários países”.

Pequeno ou grande, o circo nunca acaba  

Com a proibição da participação de animais nos circos, em alguns estados e municípios (PL de 2006 ainda aguarda aprovação no Congresso), novos números foram desenvolvidos - com mais brincadeiras de palhaços, contorcionistas, malabares, para ocupar o lugar deixado por elefantes, chimpanzés, tigres, cães amestrados.

“Eu sempre fui contra o uso de animais. O Garcia, por exemplo, foi para a África e lá se podia comprar elefantes como se compram bicicletas. Ele comprou quatro e trouxe para São Paulo. Daí virou uma potência, se tornou o ‘rei do circo’. Dominou os picadeiros Brasil afora, durante décadas, com apresentações de outros animais que foram incorporados”, conta Carlos, lembrando que o Garcia baixou a lona de vez em 2003, após sete décadas de atividades e de ter alcançado o título de quarto maior circo do mundo.

Ao longo dos últimos 20 anos, a arte circense se modernizou, sofisticou, adotou efeitos tecnológicos. Por falta de espaço (terrenos) e apoio do poder público, os pequenos circos sobrevivem nas periferias e praças de cidades de interior. O internacional Cirque de Soleil hipnotiza o público que lota suas apresentações. E o menor circo que possa existir, continua também a encantar seu pequeno mas fiel público. “O passado não está perdido, ele permanece para somar, hoje e sempre”, encerra Carlos.

 

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