Onde estão os meus sésamos?!

sexta-feira, 04 de agosto de 2017

Onde estão os meus sésamos?! Acredito que esta seja a questão que nós
escritores exclamamos antes de começar a escrever. Que seja um conto, uma
crônica, um romance. Um ensaio. Começar é sempre desafiador. É como
convidar alguém a sentar numa poltrona flutuante através de frases
verdadeiramente incomuns.
O escritor e acadêmico George dos Santos Pacheco nos motivou a refletir
sobre as palavras iniciais de um texto, ou seja, o incipit. Sim, senhor, como
dizia Alice, o início é o momento mais delicado ou angustiante de um trabalho
literário.
Abra-te Sésamo! As mágicas palavras que Ali Babá gritou ante a enorme
pedra que guardava um magnífico tesouro são como as primeiras de um texto.
Tal qual essa senha, são frases que descortinam uma ideia estruturada, criada
por um autor que pretende tocar o leitor. Enlaçá-lo. Que precisa despertar sua
vontade de continuar a ler. Decididamente, não podem ser palavras normais.
Devem ser ambiciosas e possuírem a simples intenção de sequestrar um
desconhecido a um mundo diferente do que ele está acostumado.
O sésamo é uma planta africana que produz o gergelim como semente,
alimento nutritivo e dotado de propriedade medicinais. Então, é uma senha que
vai mobilizar o escritor a encontrar palavras ricas de sentido, que façam o leitor
mergulhar num texto que lhe será fonte de alimento, além de lhe trazer enorme
prazer.
Mas a questão aqui não é o leitor. São as primeiras palavras. Únicas de
um escritor e logo me vem a imagem daquele apaixonado que fala pela
primeira vez do seu amor para a pessoa amada. Como vai desnudar esse
sentimento que o toca e enleva sua alma? Como vai descrever em poucas
palavras seus momentos platônicos que anseiam por um encontro? Como vai
sussurrar suas horas inebriadas de paixão? Uma palavra mal dita poderá ser-
lhe fatal. Mas uma frase perfeita, inédita e jamais clichê, poderá abrir-lhe
caminhos.

Agora penso naquela expressão tão comum, “era uma vez” que faz com
que a criança entre no mundo da fantasia. Que estabeleça uma nítida distinção
entre o real e o ficcional. Uma senha, como “Abra-te Sésamo”. Ao lê-la, o leitor
infantil sai do seu mundo e entra em outro. Completamente diferente do seu.
As primeiras palavras são como passagens. As melhores têm o toque secreto
que aguçam a vontade de saber o que tem depois dela.
O leitor, diante de um livro, está pronto para viajar. Ele precisa sentir
especial fascinação por algo desconhecido. São, apenas, poucas palavras
carregadas de persuasão, como se fossem um convite a uma conversa íntima.
Têm um quê de revelação.
Onde estão os meus sésamos?!

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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