O livro, um presente

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

Presentear é uma arte delicada e milenar. Não se deve presentear por ímpeto, nem baseado no gosto pessoal de quem presenteia. É necessário sentir o outro em seus gostos e expectativas, saber da sua história e compreender seus sonhos. Uma cafeteira pode ser mais significativa do que uma caneta dourada para uma pessoa e, de modo contrário, para outra. Presenteia-se por vários motivos e em datas diversas, dependendo do encontro afetivo que o presenteador quer estabelecer com o presenteado. De uma flor a um anel ou de um perfume a um enfeite, um presente pode ficar na lembrança, tornar-se uma relíquia ou ser usado até acabar. É possível que se torne invisível dentre os guardados.

Um livro pode ser um presente?

Esta é uma pergunta que me faço quando vou presentear alguém, apesar de saber que o livro tem vantagens diferenciadas de outros presentes. É um objeto silencioso que só se manifesta quando aberto:  declama poesias, conta histórias, relata fatos e mostra imagens. Talvez por isso seja um bom conversador e companhia prazerosa. O livro traz pedaços do mundo, mostra o que a pessoa tem vontade de conhecer entre o céu e o fundo do oceano, entre o ocidente e o oriente. Além do mais, é um enxerido porque adora cutucar o leitor com ideias diferentes, às vezes extravagantes. É um sábio quando faz questão de trazer a voz dos mestres. Preenche os momentos vazios da vida que gritam para serem ocupados, desalojando a inoportuna falta do que fazer. É terrivelmente irrequieto porque seu autor curte mexer com as emoções dos leitores e com aquela tranquilidade acomodada. É um fofoqueiro na medida em que revela os mais delicados segredos da humanidade. Ah, os livros clássicos superam a passagem do tempo e têm uma atualidade estonteante, fazendo o presenteado viajar por diversas épocas e lugares. É, de fato, um discreto cosmopolita que fica na estante, na mesinha de cabeceira ou na prateleira do corredor, sempre pronto a se apresentar. 

É um objeto de consumo como qualquer outro, compete com perfumes, sapatos e objetos de decoração. O presenteador há que vagar pelas ruas a pensar no que vai dar. Às vezes, o presente pode se transformar numa sina.

Será que o livro pode ser um presente razoável a quem não gosta de ler?                                                                                          

 

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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