As letras das marchinhas de carnaval

segunda-feira, 04 de março de 2019

Para início de conversa, não vou entrar no mérito literário; não pretendo avaliar se as letras das marchinhas de carnaval podem ser consideradas ou não literatura, até porque há uma discussão bem ampla a respeito.

Apenas, aqui, posso considerar que há intimidade entre suas letras com a cultura popular brasileira, além do que estão inseridas em contextos históricos, familiares, sociais e culturais, na medida em que revelam situações quotidianas, dando-lhes visibilidade, através da ironia, do elogio e da brincadeira. Sendo o carnaval uma festa popular, as letras das marchinhas trazem a voz do povo de uma época.

As marchinhas datam do final do século XIX, sendo a primeira, “Ó abre alas”, composta por Chiquinha Gonzaga, em 1899, especialmente para o cordão carnavalesco Rosa de Ouro. Na época, foi considerada um hino para os carnavalescos e, mais tarde, o símbolo do carnaval carioca.  

Ao longo dos anos seguintes e até hoje, as marchinhas animam a folia das ruas e dos salões durante o carnaval. A intenção dos letristas sempre foi a diversão, cujos versos possuem sonoridade, rima e ritmo, além do que são harmoniosos com as respectivas músicas. Suas letras, escritas em forma de poema e, mesmo podendo ser assim declamadas, ganham vida quando cantadas e dançadas. Assim sendo, possuem qualidade artística. Tanto é que as músicas compostas na primeira metade do século anterior, ainda fazem parte do carnaval de hoje, como “Daqui não saio”, “A lua é dos namorados”, “Chiquita bacana”, dentre outras.

As marchinhas são genuínas manifestações populares; não foram composições mercadológicas, muito menos subprodutos da indústria cultural. São músicas urbanas, influenciadas pela cultura de rua. Da mesma forma que o carnaval é uma festa folclórica tradicional, festejado em todos os estados brasileiros, as marchinhas fazem parte desse universo, porém são cantadas, muito especialmente, no estado do Rio de Janeiro.

Alguns compositores criaram verdadeiras obras primas, como “As pastorinhas”, de Noel Rosa, “Cidade maravilhosa, de André Filho, Balancê, de Braguinha.

As letras das marchinhas, muitas vezes metafóricas, podem suscitar boas reflexões, que mostram, de modo sutil e divertido, nossas imperfeições, como também retratam questões socioeconômicas relevantes, como “Daqui não saio”.

Assim, meus amigos leitores, quando forem brincar ou assistir o carnaval, ou mesmo escutar as marchinhas, observem as letras e vejam como, de alguma forma, elas tocam suas vidas.

 

Pra você gostar de mim

Carmem Miranda

Taí, eu fiz tudo pra você gostar de mim

Oh! Meu bem, não faz assim comigo não!

Você tem, você tem que me dar seu coração

 

Meu amor não posso esquecer

Se dá alegria também faz também sofrer

A minha vida foi sempre assim

Só chorando as mágoas que não tem fim

 

Essa história de gostar de alguém

Já é mania que as pessoas têm

Se me ajudasse Nosso Senhor

Eu não pensaria mais no amor

 

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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