Começos, sempre primeiros passos!

terça-feira, 31 de janeiro de 2017
Foto de capa

Sempre estamos diante de um primeiro passo. Eu, então, neste 2017... Ora tudo inicia para mim. A começar pelo ano. Janeiro. Depois, pela minha vida acadêmica que está cheia de projetos a realizar. Inclusive, agora, estou diante de uma página em branco; esta coluna, mais uma vez se inicia e me desafia. Esta página estonteantemente alva é minha, embora esteja sem linhas, palavras e reticências. Que me exige registrar ideias com forma e sentido. Que ativa meu pensamento, acordando-o de um sonho letárgico ou de uma sesta depois do almoço.

Enfim, começar é o pior e o melhor dos mundos; a maior desilusão e a melhor conquista. Quantos tombos a criança não leva para andar? Quantas linhas o escritor não apaga para começar um texto?  Todo começo é carregado de recomeços. Chorar é bom. Que assim seja!

A ideia primeira parte de alguma tristeza; emerge de algo que falta. De uma fenda, tal qual as que que existem no topo das montanhas, rachando-a. De um sentimento que emana dos vazios da alma. Se, por ventura, ele tivesse completude, iria escrever por quê? Para quê? Usaria seu tempo fazendo outras coisas. Porém, surfando em desencantos, encontra a alegria pura de formatá-la e escrever a primeira frase!

A sensação de um texto ser, por essência, um contato imediato com o leitor já é, por si só, inibidora. Ninguém gosta de se desnudar em vitrines. Escreve-se um diário sem maiores dificuldades, mas escrever para um outro? Um desconhecido!? Aí, mora o assombro, mesmo que breve.

Um texto literário, se assim o escritor pretenda que seja, estabelece um contato profundo e restrito com o leitor, além de ser fechado pelos limites das capas do livro, que seja virtual, inclusive. Um livro não é para ser exposto como mercadoria banal. Através de uma obra, que seja um conto mínimo, o leitor e o escritor criam uma relação íntima, de modo que, somente os dois, vão poder dizê-la. Esclarecê-la. Amá-la. E, então, no momento inicial da criação, esta privacidade vai se revelando a cada tentativa de começar. Ah, todo começo tem uma timidez. Pequena ou imensa. Que precisa ser respeitada e conduzida.

O momento da criação de uma história é o do não saber como contá-la, o da descoberta inquietante e incerta deste como. Quem vai narrar? O escritor, o dono de tudo, de todas as palavras e verdades da trama, vai ceder o poder de narrar a quem? A ele mesmo? A um homem vestido de terno preto e gravata verde. Ou a um falecido qualquer e desgrudado da vida? A única certeza que tenho é àquele que gosta de gente. E aí, este começar tem que puxar este amor, despertá-lo. Vivificá-lo. A literatura guarda valores nas entrelinhas e dentro das letras redondas, mesmo dos textos que abordem perversidades. É por isso que é abraçada por leitores, até por aqueles dispersos e desavisados que tropeçam nos livros vendidos nas calçadas.

! Quando e como se começar?  É preciso decidir se o primeiro passo será dado com a perna direita ou esquerda. Se o primeiro parágrafo vai iniciar por um ponto de interrogação ou por uma vogal. Ah, tomar decisões... O escritor é um estranho no próprio ninho, embora esteja cercado das próprias ideias e palavras; ele precisa saber onde e como quer chegar. Ninguém começa pelo fim, mesmo aquele que por aí inicie a sua história. Mas se assim o fizer é porque sabe muito bem de onde veio e pelos caminhos que passou. Conta-se uma história de muitos modos.

E o leitor também decide; seu ponto de partida está na vontade de ler por não ter o que fazer antes do pôr do sol, de encontrar o prazer na poltrona da sala ou querer ser uma pessoa melhor. A leitura sempre tem mil e uma utilidades. Aliás, tudo na vida tem suas justezas; a literatura pode ser aplicada em todos os âmbitos da existência.

Assim, há identidades entre o começar a viver e a escrever. O viver se sobrepõe ao escrever, o escrever se coloca ao lado do viver. São primos e irmãos. São amigos e poetas. São os mais genuínos gestos de um povo que acorda diariamente para viver um novo dia.   

Todos têm 2017 pela frente.

Os escritores vão contar histórias e fazer crônicas...

Biografar biscoitos e Juízos...

Escrever sobre amores e cafés...

Poetar sobre fitas e cetins...

Começar! 

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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