Entre o medo e o sonho

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

A vida humana gira em torno dessas duas vertentes e exige de todos a capacidade de movimento entre uma coisa e outra através da administração dos dois comportamentos. O medo acaba por levar ao cuidado com o exercício da profissão. O profissional é cobrado pelos seus atos e, por vezes, não tem como se eximir de culpa, apesar das justificativas. Se um médico alegou ter esquecido uma pinça dentro do abdômen do paciente porque seu salário não é compatível com seus desejos, ninguém aceita. Não adianta dizer que, se ganhasse melhor, não esqueceria a pinça lá dentro.

Temos, na vida, muitos medos: o de ousar e o de errar. Imaginemos o medo de Sócrates diante da morte após ser condenado a beber a cicuta. O medo de morrer e o de fugir. Tendo sido longo o tempo entre a sentença e o cumprimento da pena, Sócrates fugiu. No entanto, não deliberou pela fuga por causa do medo daquilo que diriam seus adversários que o consideravam um fraco. Teve medo, porém, morreu após tomar o veneno.

Os alunos têm medo dos vestibulares, os educadores têm medo das bancas examinadoras dos mestrados e doutorados, onde, muitas vezes recebem nota máxima depois de humilhações impostas pela banca. Noé deve ter tido medo do dilúvio e da arca não dar certo.

Um engenheiro também tem medo quando começa a construir e testa seus cálculos estruturais. Os políticos têm medo das urnas e os educadores, diante de uma turma de alunos, podem tremer de medo ao pensar que uma aula pode escancarar o que eles ainda não sabem.

Quase todos os oradores e conferencistas têm medo do público apesar da familiaridade com as platéias e, às vezes, do palco. Todos esses medos existem e servem para que desenvolvamos o cuidado ao fazermos as coisas e desempenharmos nossas funções profissionais.

Se os medos podem nos ajudar, precisamos tomar cuidado para que eles não diminuam nossos sonhos que correspondem à superação deles. Ninguém cresce na vida somente com o desenvolvimento do medo; crescem, sobretudo, os que acreditam na coragem e na ousadia, aplicando-as em todos os momentos em que se depara com o medo.

Os alunos aprendem mais se desafiados para enfrentar as dificuldades com coragem e ousadia, buscando os sonhos que traçaram. Assim, o educador que trabalha na ótica do medo pode “matar” o sonho dentro da imaginação dos educandos e o desastre em relação ao futuro será grande porque os sonhos precedem as realizações. Todos os grandes cientistas sonharam e imaginaram e, por isso, compreenderam a complexidade das leis que regem o universo. As grandes descobertas ocorreram, antes, na imaginação do artista ou cientista. Por isso atribui-se aos escultores a afirmação de que estão, apenas, retirando os excessos do mármore ou madeira e que a estátua já está lá dentro. É verdade, a estátua está dentro do grande pedaço rígido de pedra na imaginação do escultor.

Só a ousadia, a coragem e a certeza farão surgir a obra prima que ele imaginou. Se o escultor tiver medo não teremos a possibilidade de contemplar a estátua. Por isso quem mata a coragem, fixando-se no medo, acaba por matar a arte e a criatividade dos artistas e cientistas.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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