Um trago sem moderação na mais brasileira das bebidas

Exportação de cachaças da região de Friburgo cresce e conquista público cada vez mais exigente
sábado, 16 de setembro de 2017
por Alerrandre Barros

 

 

 

As cachaças produzidas artesanalmente em propriedades rurais da região de Nova Friburgo vêm conquistando consumidores cada vez mais exigentes com a degustação desse destilado, no Brasil e fora dele. Atentos a esse filão, o casal Ricardo Vilarinho e Camila Ponce (foto), por exemplo, lançou o rótulo Atrás da Lua há cerca de quatro anos e, desde então, vem colhendo os louros do investimento num mercado bastante competitivo.

“Produzíamos a cachaça na nossa fazenda (que tem o mesmo nome da marca), em Duas Barras, para consumo próprio e de amigos, que se admiravam com a qualidade do produto. Decidimos então investir numa produção maior e já estamos vendendo para todo o estado”, disse Vilarinho, que mora com a mulher em Nova Friburgo.

Com capacidade anual de produção de 100 mil litros, a fazenda produz cachaça envelhecida por três anos em barris de carvalho, o que confere à bebida sabor aveludado e sofisticado, ideal para degustação pura. Também faz cachaça em tonéis de aço inox, com tempo de maturação menor, límpida e adequada para drinques como caipirinha.

“Estamos agora entrando no mercado externo, que se tornou grande consumidor de cachaça. Para isso, temos feito investimento em marketing e estamos nos adequando aos padrões internacionais para alcançar os consumidores de fora, como acontece com outras bebidas, como o champanhe francês, a tequila mexicana e o whisky escocês”, diz Camila.  

No ano passado, o aumento das exportações de produtos friburguenses foi puxado pela cachaça, que, em comparação com 2015, representou, segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), 33% do total, em especial pelo aumento absoluto nas vendas da bebida para a Suíça. Destaque nesse nicho é a Nega Fulô, produzida na Fazenda Soledade, em Friburgo, que no início de 2016 ganhou um dos principais prêmios do setor nos Estados Unidos.

No Brasil, a cachaça tem como segundo maior exportador o Rio de Janeiro, responsável por cerca de 13% da receita gerada em exportação no país, o que representa cerca de US$ 1,6 milhão, e fica atrás de São Paulo, apenas. O Estado do Rio tem pouco mais de 60 produtores da bebida registrados. Os principais importadores são Alemanha, Estados Unidos, Paraguai, Uruguai e França.

As exportações da bebida cresceram 4,62% em valor e 7,87% em volume em 2016, em relação a 2015. No ano passado, 8,38 milhões de litros foram levados para 54 países, gerando receita de US$ 13,94 milhões. Para o Instituto Brasileiro de Cachaça (Ibrac), no entanto, as exportações da bebida estão bem abaixo do potencial. Cerca de 1% do volume produzido é exportado. Pouco, se comparado com a tequila, o destilado do México que, no ano passado, levou para fora cerca de 200 milhões de litros para mais de 120 países.

“O anúncio da entrada da cachaça no Simples Nacional em 2018 reduzirá a carga tributária, o que vai impactar nos custos das empresas e, com isso, possibilitará a realização de investimentos, principalmente em qualidade, por parte dos produtores”, diz, otimista, o diretor-executivo do Ibrac, Carlos Lima.

Nas exportações, a cachaça é protegida somente nos EUA, na Colômbia e no México, enquanto a tequila é em mais de 70 países. O reconhecimento americano de que a cachaça é um produto genuinamente brasileiro ocorreu em 2013, o que acabou com o tratamento generalizado em relação ao destilado nacional. Até então, a cachaça era rotulada como rum brasileiro.

A bebida destilada mais consumida no país precisa ter a graduação de álcool entre 38% e 48% para estar de acordo com as normas aprovadas e somente a aguardente de cana produzida no Brasil pode ser chamada de cachaça. São quase dois mil produtores da bebida registrados no Brasil.

Para acabar com o estigma que ainda persiste no país como bebida de segunda categoria, desde o segundo semestre de 2015, bares e restaurantes vêm recebendo o selo de Embaixada da Cachaça, da Associação dos Produtores e Amigos da Cachaça do Estado do Rio de Janeiro (Apacerj), por valorizar o destilado nos estabelecimentos.

“Queremos dar a oportunidade aos turistas de experimentarem a bebida, conhecendo suas peculiaridades, os diferentes tipos, os sabores variados. Há cachaças muito nobres que precisam ser mais conhecidas”, explica a presidente da Apacerj, Katia Espírito Santo.

Ainda somente na capital do estado, o programa qualifica profissionais de estabelecimentos com orientações sobre os tipos de cachaça, preparação de drinques e harmonização com a culinária, além de noções sobre a história da bebida e o seu valor cultural. Ao final do treinamento, os locais recebem o selo. O projeto tem parcerias com o Sebrae, Firjan, Sindbebi, Secretaria Estadual de Turismo e a TurisRio.

Em setembro, dia para “bebemorar”

Cana, caninha, pinga, “marvada”, aguardente, purinha… A ligação do brasileiro com a cachaça não vem só dos apelidos carinhosos. O destilado ganhou uma data especial, 13 de setembro, o Dia Nacional da Cachaça, escolhida pelo Ibrac, para lembrar o dia em que a coroa portuguesa liberou a produção e comercialização da cachaça no Brasil, em 1861, após a Revolta da Cachaça, rebelião dos produtores locais.

Nos tempos coloniais, o consumo da cachaça levou à redução da compra da bagaceira, produzida por Portugal, que proibiu a fabricação e a venda da cachaça em todo o território brasileiro, em 13 de setembro de 1649. Os proprietários de cana-de-açúcar e alambiques, indignados, se revoltaram em 1661, também em 13 de setembro, e tomaram o poder no Rio por cinco meses deflagrando a Revolta da Cachaça, um dos primeiros movimentos de insurreição nacional.

O projeto de lei para que a data seja oficializada ainda tramita na Câmara dos Deputados. Mesmo assim, produtores e representantes da cadeia produtiva da cachaça já comemoram a data, inclusive com estratégias de promoção para expandir suas marcas. A Atrás da Lua, por exemplo, lançou nesta quarta-feira, 13, um pequeno barril inox com cachaça maturada no carvalho por quatro anos. O produto é uma novidade no mercado.  

Duas receitas à base de cachaça fáceis de fazer em casa

Cachaça não é só para beber: é para comer também. Aliás, há quem atribua o nome da cachaça aos porcos selvagens que, na época do Brasil-colônia, eram capturados como caça e cuja carne precisava ser  embebida no destilado da cana-de açúcar para amaciar, de tão dura que era.

Convidamos o casal de chefs Jaqueline e Victor Scavarda para apresentar, com exclusividade para A VOZ DA SERRA, duas receitas à base de cachaça, bem fáceis de fazer em casa: um drinque (fora a já manjada caipirinha) e um prato.

Na verdade, um acompanhamento que, segundo Jaqueline, vai bem com tudo, sobretudo uma linguiça artesanal, uma carne vermelha na brasa ou, é claro, um hambúrguer gourmet.

Quem quiser experimentar as receitas feitas com a expertise deles, é só visitar o Scavarda’s GastroPub, no Cônego (Rua Deolinda Thurler, 52).

 

Cebola caramelizada na cachaça

Ingredientes:

8 cebolas (cortadas em Julienne)

Açúcar mascavo (3 colheres de sopa)

Cachaça envelhecida (60 ml = copinho de cachaça)

 

Modo de preparo:

Aquecer a panela em fogo médio. Acrescentar a cebola, o açúcar e metade da cachaça.

Deixar reduzir e caramelizar, até que a cebola esteja com coloração escura. Mexer quando necessário. Ao final, acrescentar o restante da cachaça, para que a cebola tenha notas e teor da bebida.

 

Rabo de Galo (um clássico que retorna triunfante!)

Ingredientes:

50 ml de cachaça Soledade Ipê

25 ml vermute rosso

Meia fatia de laranja

 

Modo de preparo:

Misturar a cachaça e o vermute em um copo com gelo. Por último, a fatia de laranja, para decorar.

 

Apenas para lembrar: o consumo de bebidas alcoólicas é proibido para menores de 18 anos.

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