Secretaria de Meio Ambiente se pronuncia sobre movimentos de terra

Confira na íntegra a carta enviada por Ivison Macedo em relação ao projeto de lei do vereador Joelson do Pote
quarta-feira, 20 de abril de 2016
por Jornal A Voz da Serra
Ivison Macedo, secretário municipal de Meio Ambiente (Foto: Lúcio Cesar Pereira)
Ivison Macedo, secretário municipal de Meio Ambiente (Foto: Lúcio Cesar Pereira)

Após publicar a defesa do projeto do vereador Joelson do Pote, A VOZ DA SERRA abre espaço para o engenheiro e secretário de Meio Ambiente dizer por que é favorável à manutenção do veto do Executivo

Confira, na íntegra, a carta enviada por Ivison Macedo à direção de A VOZ DA SERRA

"Prezados,

Em outubro de 1987 promovi um evento técnico denominado “Primeiro Seminário sobre Estabilização de Encostas de Nova Friburgo”. Este evento durou três dias e o público alvo foi composto pelos profissionais de engenharia e arquitetura que atuavam em nossa região. Naquela ocasião, os palestrantes convidados discorreram sobre as técnicas e projetos que envolviam as considerações indispensáveis e necessárias às intervenções no meio físico, visando à mitigação dos impactos decorrentes da antropização e a implementação de obras ativas e/ou passivas (contramedidas) que garantissem a segurança das instalações prediais e a integridade física das pessoas.

O texto de introdução dos Anais do Seminário (Vol. 1/2), citava as recorrentes perdas de vidas humanas em acidentes que envolviam problemas com instabilização de taludes, fruto da combinação do binômio ocupação desordenada / inexistência de projetos, e frisava o grave acidente ocorrido em 1979 quando tivemos mais de 70 vítimas fatais.

Decorridos quase trinta anos daquele seminário, a cidade ficou totalmente abandonada. Não houve compromisso do poder público com fiscalização. A cidade continuou a ocupar de forma irracional suas encostas. Não houve nenhum planejamento urbano. Durante este intervalo de tempo, ser tornou público e notório o meu posicionamento quanto a necessidade de que o poder público criasse um órgão nos moldes da Fundação Geo-Rio, por inúmeras vezes, defendi esta tese publicamente e nas esferas técnicas.

Essa ocupação desordenada que aí está implementada foi absurdamente implantada sem nenhum óbice, sem nenhuma restrição, sem nenhuma burocracia que a atrapalhasse, favorecida por um apagão das esferas públicas que a tudo fechou os olhos e não criou as condições de estruturamento técnico para coibir ou pelo menos minimizar os riscos que poderiam advir.

E o que se viu, foi o resultado do sinistro de 2011, cujas perdas materiais e de vidas humanas foram infladas em decorrência do apagão do setor público que tem por obrigação constitucional zelar pela ocupação e pelo uso do solo no território Municipal.

A proposta que aí está, se mantida, à revelia da legislação superior e da própria Constituição Federal, propõe institucionalizar a intervenção no Uso e na Ocupação do Solo sem conhecimento e autorização prévia da Autoridade Municipal a quem cabe, por dever e obrigação constitucional aplicar a legislação.

A situação só não é pior em face à atuação imprescindível do Ministério Público que, como fiscal da Lei, age de forma a coibir os abusos praticados pelos cidadãos que não respeitam a legislação ambiental e obriga o Município a intervir minimizando e /ou coibindo de alguma forma sua contumaz inércia.

A nova lei de proteção civil do Brasil, aprovada pelo poder legislativo federal e sancionada pela presidência da república em 2012, de número 12.608, constitui-se no mais importante marco regulatório criado nos últimos tempos. Visa a lei proteger a população civil brasileira, em especial aquela que vive nos municípios que possuem áreas de risco. Este diploma legal impõe a todos os entes da federação em especial aos Municípios, Estados e União, que estabeleçam planos e programas que visem a coibir a ocupação urbana em regiões e áreas que não sejam dotadas de compatibilidade de ordem geotécnico-geológica que indiquem de forma clara e segura as condicionantes que possibilitem a ocupação e as intervenções necessárias.

No âmbito Municipal, o Executivo, por Decreto do Sr. Prefeito em fevereiro de 2014, determinou a antecipação da revisão do Plano Diretor Participativo, para adequá-lo aos ditames da nova Lei Federal nº 12.608, dando assim prosseguimento a sua determinação anterior de que era imperiosa e urgente a requalificação técnica de todos os profissionais da Secretaria de Meio Ambiente, com o objetivo de garantir a atual administração, e às futuras, um embasamento técnico que possibilitasse ao Executivo a adoção de políticas públicas que propiciassem benefícios a todos os cidadãos e a busca permanente por maior equidade.

A qualificação das equipes técnicas internas da Prefeitura, em diversos setores, em especial na Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano Sustentável – Semmadus, é uma realidade. O aumento significativo do Capital Técnico da Semmadus hoje tem reconhecimento em todas as esferas de governo, em nível Municipal, Estadual e Federal. As propostas de trabalho que aqui estamos construindo têm sido adotadas como propostas referenciais por instituições de outros municípios e de outros estados além Ministério das Cidades, do BID, da terceira Conferência das Nações Unidas (ONU) sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável o Habitat III etc.

Importante ressaltar que quando o governo adota como política pública a retomada do protagonismo da governança e absorve as verdadeiras ferramentas da gestão pública, as quais estão ancoradas na qualificação de seus quadros, esta providência interfere diretamente nas forças de mercado que ultimamente, como toda a população brasileira agora conhece, não objetivam o bem comum nem a construção de uma cidade para as pessoas que nela vivem.

Escondidos sobre o pano de falsas premissas, fogem ao debate mais importante que exige conhecimentos específicos e experiência. Nesta questão em discussão, no nosso Estado do Rio de Janeiro, temos as principais instituições de ensino e pesquisa sobre a matéria em debate. Cito algumas: Serviço Geológico do Brasil – CPRM; Serviço Geológico do Estado do Rio do Janeiro – DRM; Centro de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais – Cemadem RJ; Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC RIO; Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ; Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro – IFRRJ; Universidade Federal Fluminense – UFF; Universidade Estadual Do Rio De Janeiro – Uerj; Fundação GEO-RIO; Laboratório de Geo-hidroecologia – Geoheco/UFRJ; Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro – Crea/RJ.

O conhecimento técnico acumulado por estas instituições pode e deve ser acessado para prover o debate e os esclarecimentos técnicos aos nobres componentes do Legislativo Municipal, a fim de que não pairem dúvidas sobre a matéria. Como eventuais debatedores, cito ainda eminentes profissionais que atuam em nossa região ou até têm residência no Município tais como: a Profa. Ana Luiza Coelho Netto (PhD em Geomorfologia e coordenadora do Geoheco/UFRJ); o Eng. Geotécnico Jean Pierre Paul Remy; o Prof. Cláudio Amaral (PhD em geologia e geotecnia); o Geólogo Nelson Meirim; o Eng. Geotécnico Prof. Tacio Mauro Pereira de Campos (PhD em Mecânica dos Solos); o Prof. Rogério Luiz Feijó (Doutor em Geotecnia); o Geólogo Jorge Pimentel (CPRM), entre outros.

Ao deliberar na ausência de suporte técnico adequado, estamos expondo mais uma vez nossa população, às vulnerabilidades decorrentes das mudanças climáticas as quais serão severamente agravadas pela ação antrópica indiscriminada sem conhecimento e sem autorização da autoridade Municipal.

O Brasil, pós tragédia climática na região serrana, em 2011, e em decorrência da edição da Lei nº 12.608, está criando e estruturando a cultura da integração e do planejamento preventivo para que tenhamos menos vítimas fatais. O objetivo é agir antes, baseados em conhecimento técnico, para que na ocorrência do desastre natural, estejamos previamente preparados. Neste sentido houve um acordo binacional entre o Japão e o Brasil, para o desenvolvimento de um projeto que foi denominado de Gides – Projeto de Fortalecimento da Estratégia Nacional de Gestão Integrada de Risco em Desastres Naturais.

Nova Friburgo, inserida no projeto como uma das três Cidades Piloto, tem participado com seu corpo técnico de todas as fases deste projeto que teve início em julho de 2013.

Nossas equipes formadas por técnicos da Secretaria de Meio Ambiente, da Secretaria de Obras, da Defesa Civil, do EGCP, começa a implementar, em 2 de maio, em três áreas previamente escolhidas, os testes que envolverão eixos temáticos referentes a Mapeamento de áreas que envolvem riscos a escorregamento de massas, áreas de perigo, escorregamento de blocos de rocha, áreas que precisam ser reabilitadas, monitoramento de deslocamento de encostas, áreas em que não poderá haver expansão etc. Estas técnicas serão obrigatórias a todo o País no final do ano de 2017.

Elas preveem intensa e preliminar atuação do ente público como o Gestor do Solo e do risco, que envolve vidas humanas.

A adoção da proposta prevista na Lei, vai em direção completamente oposta ao trabalho que o País está desenvolvendo, e que impacta especialmente o nosso Município, inviabilizará a implementação do Projeto Gides em Nova Friburgo, e nossa parceria com a Jica – Agência Internacional de Cooperação Japonesa.

Em face a esta matéria não ter sido debatida em termos técnicos, estabelecido o contraditório, ouvidas outras entidades representativas, ouvidos os técnicos do Ministérios da Cidade, ouvidos os técnicos da Semmadus, em fim, garantida à população friburguense, principalmente aos mais pobres que ocupam as áreas mais vulneráveis, o suporte técnico aos Nobres componentes do Legislativo, é que somos favoráveis ao veto à presente Lei, que ao nosso ver não trará nenhum benefício ao cidadão.

São estas, minhas considerações para o debate, colocando-me a inteira disposição para toda e qualquer esclarecimento em qualquer fórum, que envolva o debate técnico, para o qual venho me posicionando de forma clara, objetiva e transparente, desde que comecei a trabalhar nesta área, em 1975.

Nova Friburgo, 15 de abril de 2016.

Eng. Ivison Soares Macedo

Secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano Sustentável"

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