Paralisação da Uerj causa prejuízos a empresários de Nova Friburgo

Aulas no campus voltariam nesta segunda-feira, mas foram adiadas novamente
terça-feira, 28 de março de 2017
por Karine Knust
Movimento de restaurante próximo à universidade caiu cerca de 40% após crise da Uerj (Foto: Henrique Pinheiro)
Movimento de restaurante próximo à universidade caiu cerca de 40% após crise da Uerj (Foto: Henrique Pinheiro)

Estudantes sem aulas, professores sem pagamento, espaços sem manutenção. A grave crise que assola a Universidade Estadual do Rio de Janeiro - Uerj há meses tem gerado consequências extremamente prejudiciais aos alunos e docentes que fazem parte da instituição. Mas não são só eles os afetados pelo problema, que parece estar longe de acabar. Empresários que possuem comércios e repúblicas próximas aos campi têm sofrido com a perda de clientes. Em Nova Friburgo não é diferente.

Alex Bello Quintella, de 56 anos, é dono da única cantina localizada dentro do campus Friburgo da Uerj. O comerciante tinha um salário de R$ 2 mil por mês, mas assim que as aulas pararam a renda deixou de existir. “Trabalho com comércio há mais de 20 anos e nunca passei por uma situação como essa. Vendia cerca de 120 salgados por dia, fora os outros lanches e bebidas, agora não vendo nenhum. Desde que as aulas pararam em dezembro eu parei de vir para a cantina, não adianta vir para cá porque não vou ter clientes”, declara Alex.

Na Vila Amélia, um restaurante próximo ao campus também tem sentido os efeitos da crise na instituição. “A tragédia de 2011 foi devastadora para gente, porque a fábrica ficou fechada, o Sesi saiu daqui, os moradores deixaram de comprar. A vinda da Uerj para o bairro foi a nossa salvação. Não tínhamos estrutura para atender os alunos da universidade, mas nos adaptamos a eles”, conta o empresário Marson Lopes de Araújo, de 61 anos, acrescentando que “quando eles vieram para o bairro, passamos a atender mais de 100 professores e estudantes na hora do almoço, fora os mais de 400 salgados que vendíamos por dia”.

De acordo com Marson, a queda nas vendas resultou na diminuição do quadro de funcionários. “Com a paralisação, nosso movimento diminuiu de 30 a 40%. Tínhamos dez funcionários para cuidar do restaurante, lanchonete e mercadinho, mas depois dessa situação tivemos que demitir dois deles”.

Quartos vazios

Com diversas instituições de ensino superior em Nova Friburgo, muita gente vê nesse mercado a chance de aumentar a renda, oferecendo quartos ou imóveis para alugar para quem vem para o município com o intuito de estudar. Neste ramo há mais de 10 anos, Maria Marília Vasconcelos, de 61 anos, incrementa a aposentadoria alugando para estudantes algumas das suítes de sua casa na Rua General Osório, no centro da cidade. Com uma república prioritariamente masculina, Maria conta que a maioria dos inquilinos são alunos da Uerj, mas, sem aulas, todos voltaram para casa.

“Tem sido um prejuízo muito grande. Tenho nove leitos e, atualmente, todos estão vazios”, lamenta Maria, que chegava a receber R$ 3 mil por mês em aluguéis antes da paralisação. “É uma situação muito complicada para mim mas, como cidadã, também acho isso tudo muito triste. Um local com uma estrutura tão boa, uma universidade conceituada, agora passando por um sucateamento tão grande. O governo deveria olhar com mais sensibilidade a situação de setores tão importantes como a Educação”, desabafa ela.

Futuro ainda incerto

As aulas do segundo semestre ainda de 2016 deveriam começar em 17 de janeiro deste ano. Foram seis adiamentos do ano letivo desde então. A esperança de alunos, professores e empresários estava nesta segunda-feira, 27 - nova data estipulada - mas as aulas foram novamente adiadas após uma reunião entre a reitoria e o  Fórum de Diretores de Unidades da Uerj, na última quinta-feira, 23. De acordo com a reitoria da instituição, a decisão foi tomada porque medidas essenciais para o funcionamento da universidade ainda não se concretizaram.

Dentre os elementos cruciais que ainda não foram solucionados estão a regularização dos serviços de limpeza, coleta de lixo e elevadores; pagamento das bolsas aos alunos cotistas (auxílio-permanência) referentes ao mês de fevereiro; e a divulgação de calendário de pagamento de salários e das diversas modalidades de bolsas, referente ao mês de fevereiro.  

Ainda segundo nota divulgada, “a Uerj continua empenhada em buscar, nos poderes judiciário e legislativo, as condições para o pleno exercício de sua autonomia financeira. A Reitoria, em conformidade com o Fórum de Diretores, entende que essa decisão continua pautada pela preocupação com o restabelecimento de condições dignas e respeitosas para com a comunidade universitária, em sintonia com a nossa missão constitucional frente à sociedade, notadamente, aos nossos estudantes”.

Uma nova avaliação conjunta do quadro geral da unidade será realizada nesta quarta-feira, dia 29.

Polêmica

Na última semana, uma declaração divulgada em diversos veículos de comunicação gerou revolta e polêmica entre servidores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro. O assunto se referia a ameaça de corte de 30% dos salários de professores e funcionários da instituição na tentativa de forçar o retorno às atividades. A medida, no entanto, não deve vingar devido a barreiras jurídicas. Mas a  Procuradoria Geral do Estado (PGE) estuda entrar com ação na Justiça para que a unidade funcione em breve.

Com paralisação, Uerj começa a perder alunos

A incerteza quanto ao fim da paralisação na Uerj e a reestruturação dos campi tem levado estudantes a desistir de cursos. Em Nova Friburgo, até o ano passado, a unidade contava com mais de 600 alunos. Agora, entretanto, o número tem diminuído. A estudante Karina Pimentel Pascoal, de 20 anos, fazia Engenharia da Computação na Uerj Friburgo, mas acabou abandonando o curso no ano passado.

“Deixei a faculdade no quarto período. Já era para eu estar no quinto, mas a greve durou tanto tempo que não consegui. Se não fosse a greve, talvez eu não tivesse saído porque eu gostava bastante da Uerj em si, tinha conseguido uma iniciação científica numa área muito interessante e estava crescendo na Serra Jr. Engenharia. A empresa me animava muito a continuar. Fiquei muito triste por toda a situação. A faculdade é o primeiro contato com o futuro que queremos. Com essa situação da Uerj, a gente tem ficado um pouco sem visão e sem esperança”, conta Karina.

Breno Dutra, de 22 anos, também do curso de Engenharia da Computação, tentou mudar de faculdade, mas ainda não conseguiu. Morador de Valença, cidade no sul do estado, o jovem afirma que não vem a Nova Friburgo desde dezembro. “Moro em Valença, são umas cinco horas de viagem até Friburgo. Costumo voltar para casa só no fim de cada semestre, mas sem aulas estou pagando o aluguel sem frequentar o apartamento. Recebo uma bolsa do governo para isso, que inclusive está atrasada há dois meses. Já tentei mudar de faculdade, mas a que eu pretendia trocar só permite transferência se abrir vaga para o curso e isso não aconteceu. Gosto muito da Uerj, estou tentando fazer de tudo para não sair. Mas a situação está muito complicada”, afirma o estudante.

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“Vendia cerca de 120 salgados por dia, fora os outros lanches e bebidas, agora não vendo nenhum”, lamenta Alex Bello Quintella (Foto: Henrique Pinheiro)
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TAGS: UERJ | economia
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