Mudança de gestão, sócio-torcedor e criatividade: o futuro do Frizão

Confira a entrevista exclusiva do gerente do Friburguense, José Siqueira
segunda-feira, 02 de maio de 2016
por Jornal A Voz da Serra
Siqueira e os novos desafios: mudança de gestão e fortalecimento da base
Siqueira e os novos desafios: mudança de gestão e fortalecimento da base

Um cenário desafiador. Em meio ao momento difícil que o país atravessa, o Friburguense terá que superar, além do rebaixamento para o campeonato carioca da série B, uma queda de aproximadamente 75% de suas receitas para se reerguer dentro do cenário estadual. Sem o dinheiro da cota de televisão e outros rendimentos provenientes da primeira divisão, o baque se aproxima do valor de R$ 1,5 milhão, dentro de uma previsão orçamentária que girava em torno de R$ 2 milhões. Esse montante era distribuído entre os 12 meses de trabalho.

De fato, a queda levou o Friburguense a fazer algumas reflexões. Uma delas diz respeito ao modelo de gestão do futebol, que deverá sofrer mudanças nos próximos anos. O gerente José Siqueira continua à frente, mas o clube deverá participar de forma mais efetiva. Dentro desse contexto, o Tricolor da Serra planeja algumas ações para aproximar ainda mais os torcedores. O mês de maio poderá ser decisivo para a captação de recursos, com a tentativa de viabilizar situações de patrocínio e parcerias.

“Precisamos sair da dependência do dinheiro da Federação e da TV. Temos também um projeto para montar uma empresa dentro do Friburguense, trabalhar melhor a questão do material esportivo, criar um bar permanente dentro do estádio, um sócio-torcedor e desenvolver ações para aproximar a população do clube.”

Em entrevista exclusiva para A VOZ DA SERRA, Siqueira aborda exatamente essas questões, que poderão ser decisivas a médio e longo prazo para o futuro do clube. Ao analisar o rebaixamento, o dirigente fala, por exemplo, sobre o peso da venda dos jogadores Maycon e Rômulo e o regulamento. Ao projetar os próximos meses, destaca a importância de Nova Friburgo abraçar o Friburguense em seu novo desafio.

A VOZ DA SERRA: Passadas duas semanas do jogo que definiu o rebaixamento, é possível dizer que o clube já assimilou o golpe? Quais as primeiras providências?
Siqueira: Apesar de estar muito recente, precisamos criar força e não parar. O rebaixamento envolve tudo, até mesmo o nosso trabalho de base. Diferente de 2011 teremos uma competição diferente na série B. Não é mais pontos corridos, e sim, fases. Se você ganha um turno, há ainda a necessidade de disputa de novas finais. É preciso fazer bons jogos e ainda ir bem nas partidas decisivas. É uma dificuldade maior. Em 2011, por conta da tragédia também, conseguimos mobilizar a cidade. No primeiro jogo, contra a Portuguesa, atraímos um grande público. O Friburguense é importante para a cidade, para a autoestima, e precisamos criar novamente esse envolvimento. A mudança de elenco também acontecerá, e o processo vai ser de 50 a 60% de alterações de jogadores. A comissão técnica e a gestão também vão mudar. Ou seja, temos pensado de uma forma geral.

É possível dizer que o cenário atual é mais desafiador que o de 2011, quando o clube também jogou a série B?
O momento que o país vive é de crise, muito complicado. Ainda teremos o retorno dos patrocinadores, como foi com a própria Stam em 2011, quando ela abraçou o Friburguense. Não que ela tenha a obrigação de fazer a mesma coisa agora, até porque o momento financeiro é outro. Não queremos comparar, mas a dificuldade é muito maior dessa vez e teremos que rever o modelo de gestão.

Muita gente tem questionado as vendas do Maycon e do Rômulo no meio do campeonato, e de certa forma até mesmo associado aos resultados. Como você avalia o peso dessas duas baixas?
São dois jogadores que fazem falta em qualquer equipe. Mas se analisarmos os resultados, nós fomos muito intensos no ataque com os jogadores que ficaram. É natural querer apontar alguma coisa quando o resultado não é bom. Encontrar explicações é complicado até para quem está no dia a dia do clube. O Maycon saiu ainda na primeira fase, e nós perdemos o primeiro jogo da Taça Rio com o Rômulo em campo. Depois vencemos o América por 2 a 0 sem ele. Ou seja, os gols saíram. Se pegarmos só a segunda fase, marcamos contra o Macaé, Resende e até no resultado desastroso contra o Bonsucesso. O problema é que levamos muitos gols, algo que foge da nossa característica. Faltou uma entrega maior na marcação, acima da questão de uma hipotética falta de gols.

Entrando no assunto gestão, o atual modelo adotado pelo Friburguense nos últimos anos é sempre discutido. Até por conta da realidade difícil que se anuncia, talvez seja o momento de rever algo nesse sentido?
A gestão joga uma responsabilidade muito grande para a pessoa do Siqueira. O clube continua mantendo as receitas na parte social sem trazer nada para o futebol. Esse modelo está complicado, não só pelos riscos, mas pelo processo de elitização do futebol brasileiro. As datas são menores a cada ano que passa, com as constantes mudanças de regulamento. Esse ano os 15 jogos foram divididos em duas fases, e o fato de zerar os pontos foi um pecado desse regulamento. A grande imprensa trabalha que é a hora dos clubes se libertarem das federações e trabalharem as próprias ligas. Não estamos preparados para isso. Primeiro porque os grandes clubes não entendem a importância dos pequenos para a formação de jogadores. Hoje os dirigentes estão mais preocupados em não deixar dívidas, e por isso, os pequenos não vão fazer parte das ligas. Vejo a necessidade da mudança do processo de gestão. A tendência é mesmo enfraquecer os estaduais e dificultar a participação em divisões inferiores do futebol nacional. Precisamos sair da dependência do dinheiro da Federação e da TV, continuar o processo de buscar patrocínios e expor a marca. Temos também um projeto para montar uma empresa dentro do Friburguense. Os próprios garotos da base poderão ter uma receita dentro do clube, uma vez que muitos desistem por questões financeiras. Vamos criar uma empresa para atrair parceiros, trabalhar melhor a questão do material esportivo, criar um bar permanente dentro do estádio e um sócio-torcedor. Também vamos desenvolver ações para aproximar a população do clube. A cidade precisa entender a importância do Friburguense.

Como seria estruturado esse sócio-torcedor?
Não podemos entrar numa situação sem criar oportunidades, e o mês de maio vai ser fundamental. Vamos fazer contato com a Federação, a Stam e outros empresários, além de lançar esse sócio-torcedor. Num primeiro momento vai ser direcionado para os que já são parceiros. Esse é o primeiro movimento para aproximar o clube e a cidade, baseado no que é feito nos grandes times brasileiros. A diferença é que não temos a mesma paixão centenária dos grandes. Vamos atrair os parceiros a partir de maio, sejam 200 ou 400, e depois aperfeiçoaremos o processo.”

Dentro desse contexto, o trabalho de base é fundamental. E com a diminuição das receitas, mantê-lo é mais um desafio. Como trabalhar essa questão?
Esse é o grande desafio até o início da segunda divisão. Disputamos todas as competições, do sub-11 ao sub-20. Somos um clube sem fins lucrativos, e muita gente não se atenta a isso. Grandes clubes investem em um campeonato apenas, e às vezes até terceirizam a base. Creio que o clube, dentro da minha gestão, deve ser formador de atletas. Desde que entrei aqui, todas as verbas com vendas de jogadores, como o Rômulo, foram direcionadas para cobrir as dívidas de investimentos como esses, que são feitos na base. Temos um desafio de R$ 150 mil a R$ 170 mil mensais, e isso cobre também as divisões de base. O orçamento era de R$ 2 milhões, e agora perdemos R$ 1,5 milhão. A atitude seria parar tudo, mas vamos continuar. As coisas vão acontecer. Ouvimos muito na cidade algumas historinhas, mas observamos que muitos jogadores que passaram por aqui estão encaminhados, como é o caso agora do Fut-7. Conseguem ser diferentes dentro de empresas e profissões por terem passado por aqui. Mais de 90% desses atletas estão fora das drogas e com boas oportunidades, inclusive, nos campeonatos amadores. Queremos mudar aquela história de que o Friburguense não usa jogador de Nova Friburgo, que não aproveita um ou outro. É ao contrário. As pessoas é que não possuem a noção de onde o Friburguense pode levar. Alguns não admitem ou não possuem o caráter de reconhecer que não se dedicaram o suficiente para se tornarem profissionais enquanto estiveram no clube.

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