Meio ambiente: entrevista com secretário municipal de Agricultura

Produtos químicos devem desaparecer do mercado em futuro próximo, diz Alexandre Teixeira
quinta-feira, 08 de junho de 2017
por Ana Borges
Meio ambiente: entrevista com secretário municipal de Agricultura

Nova Friburgo é uma terra tão abençoada que por aqui não tem entressafra. Semeamos, plantamos, colhemos, o ano inteiro. Cada estação tem seus produtos típicos: frutos, frutas, folhas, verduras, hortaliças de todos os gêneros, além das trutas. Shiitake também, agora, até o substrato (composto) para cultivar os cogumelos. São cerca de cinco mil produtores, entre convencionais e orgânicos, um celeiro de dar gosto e que nos enche de orgulho. Funciona nas quatro estações: outono, inverno, primavera, verão.

Uma cultura típica da primavera-verão, por exemplo, é o tomate, cujo início de plantio é a partir de setembro, e o de colheita pode se estender pelo outono e até inverno. Segundo o secretário de Agricultura, o engenheiro agrônomo Alexandre Teixeira, dificilmente se consegue sucesso em termos de produtividade plantando tomate no final do verão para o outono, porque a floração e a frutificação dele vai coincidir com o período mais frio. Por detalhes como esses, tem-se uma ideia do quanto o conhecimento é valioso para a devida produção.

“Além disso, o município tem áreas para todos os tipos de cultivo. Naquelas onde os produtos são mais suscetíveis a geadas, mais sensíveis ao clima, deve-se cultivar plantas típicas do outono-inverno. Em áreas onde costuma cair um grande volume de chuva, qualquer plantação sucumbe, seja ela de que tipo for. Neste caso, o agricultor, sabendo disso, evita áreas onde alagamentos são recorrentes. Para evitar problemas desse tipo, não se planta em áreas baixas onde há inundações”, explicou o secretário.

Ao se observar o crescimento dos movimentos sociais mundo afora contra a poluição, agrotóxicos, fertilizantes, produtos químicos, enfim, lixo, soltos e despejados, sem controle nem constrangimento, na atmosfera terrestre, nos solos, rios e oceanos, vislumbra-se um fio de esperança na recuperação e retorno às práticas antigas. Ao tempo em que o homem plantava em comunhão com a natureza, em que a agricultura não agredia o meio ambiente, em que ambos conviviam em harmonia.  E as pessoas eram saudáveis. Olhar para trás é importante, e mais do que nunca, esclarecedor. Ainda não aprendemos que não é destruindo florestas que vamos garantir a nossa sobrevivência. Pelo contrário.

Pacote de estupidez

Essa questão de produtos químicos foi um pacote que nós importamos há muitos anos, em função do desenvolvimento dessas indústrias em outros países. Servimos de cobaias, como consumidores em nosso sistema de produção, lembrou Alexandre. “Não devemos esquecer que a agricultura surgiu nos primórdios do convívio harmônico com o meio ambiente. No tempo dos homens de vida bem rudimentar, começou-se a plantar nas florestas, abrindo pequenas áreas, preservando um sistema de sombreamento, fazendo uma agricultura de subsistência. Nas áreas onde havia mata, um ambiente equilibrado, teve início esses plantios de fácil convivência e pequenas trocas nas comunidades. Não havia a demanda por alimentos que temos hoje, com uma população que superlota o planeta. O que levou à necessidade de expandir as áreas para plantio e facilitou a consequente inserção de produtos químicos nas lavouras para dar conta da crescente procura por comida”.

O secretário explica que nestas áreas de maiores dimensões foram instaladas pequenas monoculturas, formadas por várias plantas da mesma espécie em sequência. O resultado dessa prática é o desequilíbrio do meio. Antigamente, para a simples subsistência, o produtor plantava, digamos, 100 pés de milho. À medida que ele começou a produzir para terceiros, passou a plantar centenas de milhares de pés de milho. Era milho numa área, feijão em outra, arroz em outra… assim por diante. Quando se planta muitos pés de uma mesma espécie, ela é monocultura.

Para garantir tamanha produção, entrou em cena a “praga” para matar pragas, traduzindo, os inseticidas, o pacote de estupidez. É mais fácil fazer o manejo desse tipo de cultura, o controle de pragas e doenças, e de capina. “Cada planta tem o seu ciclo e se você coloca tudo isso junto, pensando em larga escala, você acaba criando uma certa confusão no trato dessas culturas. Então, quando se concentra uma grande quantidade de plantas de uma mesma espécie, isso vai resultar numa certa pressão de pragas, fungos, vírus e bactérias, que enxergam ali uma oportunidade de alimentação e proliferação. Nessa sequência, veio a necessidade de controlar as doenças. Daí, o investimento em produtos químicos e a adoção dos agrotóxicos”, ressaltou o secretário.  

Aos tempos primordiais

Quando o meio era equilibrado, combatiam-se as pragas com produtos alternativos com pulverização de ervas, de extratos. Depois, foi necessária a utilização de um produto biocida com o qual se eliminava toda a praga. Em seguida, vieram as pesquisas. Com a evolução desses produtos e seu uso, eliminava-se a praga mas também seus inimigos naturais. Naquela época, em que todos os seres conviviam, havia os insetos que destruíam as lavouras e também aqueles que comiam esses insetos perniciosos às plantações. Resumindo, criou-se um produto químico para pulverizar uma praga que mata também os insetos que atuam como exterminadores naturais. Dessa forma, chegamos ao desequilíbrio, à interferência na cadeia natural da vida.

“Nem assim se eliminava por completo a praga, porque as que sobreviviam se tornavam resistentes. Na geração seguinte, a pulverização que era feita para controlar as pragas já não funcionavam. Daí vem a história da mercantilização dos produtos químicos, a diminuição da produtividade, a esterilização do solo, a necessidade do fertilizante químico. As ervas saudáveis que antigamente eram usadas para combater as pragas estão contaminadas, já não atuam como antes, e assim por diante. Tudo vai degenerando numa escalada perigosa até ficar incontrolável, tornar-se irreversível. É o desequilíbrio cada vez mais presente”, relatou.

Para Alexandre Teixeira, ambiente e agricultura estão interligadas, são questões indissolúveis, irremediavelmente entrelaçadas. Não tem como separar uma da outra. “Hoje, o que devemos tentar, é sair dessa agricultura química e retornar aos primórdios dos primeiros cultivos. Recuperar e levar vida ao solo, devolver sua natural fertilidade, para nele conjugar alguns tipos de plantas em termos de consórcio para que fiquem protegidas das doenças. Poder usar o máximo de adubação orgânica possível visando a nutrição da planta e o equilíbrio do solo. E aos poucos ir substituindo os produtos químicos pelos alternativos, que são os menos agressivos para chegar ao ponto ideal, onde possamos conviver com as pragas sem perder o que foi plantado, sem que haja destruição. Porque, se há equilíbrio, a natureza tem meios de se defender e sobreviver. Da mesma forma, o homem. Penso que não haja mais espaço para produtos químicos. Temos que virar essa página, porque não deu certo”.

Segundo o secretário, este governo tem por premissa que todas as secretarias trabalhem em conjunto, para que suas ações sejam complementares. Umas mais com outras, como no caso da agricultura, meio ambiente e saúde.

“Na agricultura, por tudo que ela abrange, é absolutamente natural a sua ligação com o meio, que por sua vez tem tudo a ver com qualidade de vida, portanto, saúde. Não dá para dissociar uma da outra. Pode ocorrer, por exemplo, de uma pessoa ir a um posto de saúde com sintomas comuns que podem estar associados diretamente ao ambiente em que vive, à sua atividade profissional. Dor de cabeça, náusea, vômito, entre outros, podem ser associados ao uso e manuseio indevido de produtos químicos, e não a um vírus ou gripe. Enfim, estas três secretarias trabalham juntas. Quanto mais a agricultura disseminar a ideia de uma produção limpa, o solo, as águas, os rios, as matas vão agradecer. O ambiente e a saúde também”, encerrou Alexandre.

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TAGS: agricultura | Meio Ambiente
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