E se fizéssemos o trajeto Olaria x Conselheiro via Uber?

Entenda o aplicativo que causa revolta em taxistas do mundo inteiro; Rio de Janeiro estabelece multa para motoristas cadastrados no serviço; vereador propõe proibição em Nova Friburgo
domingo, 30 de agosto de 2015
por Ana Blue
E se fizéssemos o trajeto Olaria x Conselheiro via Uber?

Na última terça-feira, 25, a Câmara de Vereadores do Rio aprovou em segunda discussão — com 43 votos dos 48 vereadores presentes, e apenas um voto contra — o texto substitutivo ao projeto de lei nº 593/13, que pretende regulamentar o transporte individual de passageiros na cidade, prevendo multas que variam de R$ 3 mil (motorista) a R$ 7 mil (empresa) aos que a desrespeitarem. O projeto, aprovado em primeira discussão no último dia 20, é de autoria dos vereadores S. Ferraz (PMDB) e Cesar Maia (DEM), e embora não deixe claro em sua íntegra, chega em um momento decisivo para combater um alvo específico, muito além dos táxis, vans e kombis ilegais que tomam as ruas do Rio de Janeiro: o Uber. Mas, afinal, o que é o Uber?

Nada mais que um aplicativo — de uma empresa de tecnologia também chamada Uber — que conecta passageiro e motorista, numa relação semelhante ao serviço de táxi. Ora definido como um “sistema de carona paga”, ora como uma alternativa mais cômoda e luxuosa ao táxi, o Uber divide opiniões desde 2009, ano de seu lançamento, nos Estados Unidos. Gerou protestos acalorados na França, foi proibido em Portugal, recebeu reações negativas em seu próprio país de origem e, como não poderia deixar de ser, em 2014, o Uber chegou ao Brasil, mais precisamente na Cidade Maravilhosa. Trazendo com ele toda a polêmica que lhe fora característica. E junto com a Copa do Mundo.

Funciona assim. Depois de fazer o download do aplicativo no smartphone, o usuário deve criar uma conta. Uma vez tendo acesso ao app, qualquer pessoa pode localizar um motorista cadastrado no Uber nas proximidades e contatá-lo para pedir o serviço de transporte. Não há pagamento em espécie: no ato do cadastro, o usuário fornece o número de seu cartão de crédito. A Uber (empresa) fica com 20% do combinado na transação; o motorista, com o restante.

Acessar o celular, solicitar a alguém que nos leve de um ponto A para o ponto B, depois pagar a esse alguém por isso. Parece familiar? Sim, o serviço de transporte remunerado de pessoas — tal qual conhecemos hoje — já não é novidade desde o início do século XIX, quando o alemão Wilhelm Bruhn inventou o taxímetro. E o Uber, pelos taxistas, é visto como um serviço clandestino, que pretende ocupar o já acirrado espaço no mercado e a um custo muito menor — vale lembrar que o táxi, para estar na rua, precisa cumprir determinadas exigências impostas pela Prefeitura, além de arcar com taxas e passar por vistorias constantemente. Isso sem falar na licença concedida pelo Poder Público, que tem um valor alto no mercado, de acordo com a cidade. No Rio de Janeiro, por exemplo, esta licença gira em torno de R$ 60 mil nos pontos mais baratos, sendo ainda mais alto o preço em pontos de grande movimento de pessoas, como os aeroportos. Em Friburgo, uma licença para se atuar no ponto do Centro de Turismo, por exemplo, chega a ser vendida por R$ 120 mil. Por esse motivo, muitos taxistas alugam os pontos em vez de comprá-los, pagando um valor diário, semanal ou mensal — o aluguel mensal por aqui gira em torno de um salário mínimo.

Como o Uber não é regulamentado, não passa por este crivo nem se subordina, por ora, às regras impostas aos táxis pelo poder público, causou revolta entre os taxistas, que entendem ter preferência no serviço. Mas, para nós, que apenas usamos os serviços e não fazemos parte da briga (pelo menos, não na linha de frente), fica a pergunta: quem está com a razão?

De um lado, a novidade do Uber...

Com o slogan “Uber é seu motorista particular”, a intenção é oferecer um serviço de alto padrão para os usuários do aplicativo — e isso se evidencia na escolha dos carros, que devem ser modelos de luxo, preferencialmente pretos, e que ofereçam pequenos itens de conforto para os passageiros, como bebidas e doces. Os motoristas usam roupas sociais, tais como os motoristas particulares. Além disso, as pessoas que pretendem prestar serviço para a Uber passam por uma checagem de antecedentes criminais, devem ter carteira de habilitação que permita a atividade de motorista profissional, devem ser donas do próprio carro, entre outros critérios. Um adendo: os motoristas do Uber geralmente são reconhecidos pelo nível intelectual, já que há profissionais de todas as áreas (advogados, administradores) entrando para este novo nicho de mercado.

O Uber também cobra a saída — conhecida como bandeirada nos táxis —, quilometragem e minuto parado, mas com a promessa de ser mais barato que o táxi. No Rio de Janeiro, há duas categorias de Uber hoje: o Uber Black e o Uber X. Enquanto o primeiro segue o padrão de carros de luxo, o segundo permite que carros mais simples sejam usados, e a um custo menor. Os preços estão assim: o Black cobra R$ 5 a saída, R$ 2,20 por quilômetro e R$ 0,30 por minuto parado. O X cobra R$ 3, R$ 1,40 e R$ 0,25, respectivamente. No táxi, estes valores ficam assim estabelecidos: R$ 5,20 a bandeirada, R$ 2,05 por quilômetro na bandeira 1 e R$ 2,46 na bandeira 2. Sai mais caro.

Do outro, os taxistas irritados

Para os taxistas, o Uber vem como uma concorrência desleal, ilegal e clandestina. Como para operar um táxi o motorista é obrigado a seguir os trâmites já citados (conseguir alvará, a licença especial emitida pelas prefeituras ou comprá-las ou alugá-las por valores muitas vezes exorbitantes), na visão deles seria injusto que, sem a menor cerimônia, aparecessem motoristas ‘roubando’ os seus clientes. Inclusive, em algumas cidades, não é raro que brigas e ameaças entre taxistas e motoristas do Uber virem notícia.

Os taxistas não ficaram parados. Em São Paulo e no Rio, os protestos da categoria vêm movimentando milhares de pessoas nas avenidas. A Câmara de Vereadores de São Paulo também agiu rápido e aprovou, em 30 de junho deste ano, projeto de lei que suspende a operacionalização do Uber. No Rio, a decisão agora está nas mãos do prefeito Eduardo Paes – que já se mostrou sensível à causa dos taxistas.

Uber em Nova Friburgo: você vê vantagem?

Em Nova Friburgo, os valores do serviço de táxi estão assim estabelecidos: R$ 5 a bandeirada, R$ 3,17 por quilômetro na bandeira 1 e R$ 4,15 na bandeira 2 – valores altos, se comparados com as capitais.

Em termos práticos, se o Uber se estabelecesse por aqui, tomando como base o trajeto mais famoso da cidade, por exemplo, as contas ficariam assim: são 11 quilômetros de trajeto, a R$ 3,17/km (considerando só a bandeira 1), mais a bandeirada, o que dá aproximadamente R$ 40. Como o Uber promete ser até 30% mais barato que o táxi, este trajeto sairia a R$ 28. Isso num carro com tratamento VIP, água, balinha e você ainda escolhe a música. Com a economia de R$ 12, ainda pode comer uma casquinha de queijo no Apertadinho. No, entanto, o vereador Christiano Huguenin (Solidariedade) apresentou no último dia 6 um projeto de lei que também prevê multa (que pode chegar a R$ 1.355,00) para motoristas do Uber que resolverem se aventurar por estas bandas. Ou seja, o aplicativo nem chegou por aqui e já gerou barulho na Câmara.

Ok, taxistas e Ubers estão brigando. Então, como resolver o impasse?

Quem defende o táxi se apega principalmente à legislação, mais especificamente a lei federal n.º 12.468/2011, que regulamenta a profissão. Fala-se até em evasão de divisas, já que 20% do faturamento do Uber vai para a empresa, sediada nos Estados Unidos, ou seja, gerando renda fora daqui. Quem defende o Uber diz que o serviço é diferente do táxi, pois se equipara à contratação de um serviço de motorista particular - algo que não está em desacordo com a lei. Para estas pessoas, o Uber apenas conecta clientes e prestadores de serviço, e isso não poderia ser caracterizado como crime nem concorrência desleal.

Uma possibilidade aventada frequentemente é que se regularize o Uber, obrigando empresas e motoristas a seguirem as regras e a se submeterem aos trâmites a que os taxistas já estão submetidos. Ou seja, regulamentar, em vez de proibir. O senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES) apresentou no último dia 12 um projeto de lei do Senado que propõe as diretrizes para a regulamentação do transporte individual de passageiros em todo o Brasil; segundo este projeto, o Uber poderia operar normalmente, seguindo determinados critérios. Resta aguardar.

Fato é que o Uber é um fenômeno mundial, provindo da tecnologia que tanto revolucionou a vida das pessoas neste século. Não é algo que possa ser ignorado. A discussão está só começando.

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TAGS: uber | mobilidade urbana | Trânsito | táxi | regulamentação
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