Dia do Professor: os desafios de uma profissão nem sempre valorizada

Sem a figura do mestre, toda a estrutura social cairia por terra no espaço de uma geração
quarta-feira, 14 de outubro de 2015
por Márcio Madeira
Wanderson Breder, professor de matemática e física
Wanderson Breder, professor de matemática e física

Atribuir ao professor o status de profissional dos mais importantes, justamente por ser aquele que possibilita a formação de todos os demais, tornou-se um clichê inevitável ao longo dos anos simplesmente por ser uma afirmação verdadeira. De fato, sem a figura do mestre, toda a estrutura social cairia por terra no espaço de uma geração. Apesar de desempenhar papel tão fundamental, no entanto, a classe — sobretudo em terras brasileiras — ainda padece com baixos salários e condições precárias de trabalho.

A fim de dar voz a esses abnegados e compreender quais suas maiores frustrações e satisfações, A VOZ DA SERRA entrevistou Wanderson Breder, professor de matemática e física com mais de 20 anos de experiência nas salas de aula friburguenses.

A VOZ DA SERRA: O que o levou a se tornar professor?
Wanderson Breder: Na verdade, minha intenção inicial com relação a matemática era a de me preparar para um concurso público. Não pensava em dar aulas, porque já sabia que a vida de professor é muito sofrida. Mas durante a faculdade as coisas aconteceram naturalmente. Em 1994 eu assinei um contrato para trabalhar no Colégio Estadual Jamil El-Jaick. No ano seguinte fiz outro contrato com o estado, e em 1996 terminei a faculdade e comecei a trabalhar em diversas escolas da cidade. Comecei no Colégio União, depois fui contratado pelo Sesi, pelo Nossa Senhora das Mercês, Nossa Senhora das Graças, Fribourg, São Domingos, e passei no concurso do estado, onde hoje tenho duas matrículas. Olhando para trás, acredito que tanto eu quanto minha irmã [Gisele Breder] tenhamos nos tornado professores também por influência de nosso tio, Gérson Breder, que é professor de matemática.

O que te anima, e o que te desanima na profissão?
Já tenho bastante tempo de estrada, e o que continua me motivando a vir para a escola é o retorno que alguns alunos nos dão. Dentro de uma turma tem sempre aquele percentual de alunos que querem dar um retorno para a família, querem estudar realmente, correm atrás. Poucos alunos realmente têm essa disposição, mas quando o aluno mostra esse interesse, nenhum de nós se importa em trabalhar fora do horário e dar todo tipo de apoio ao aluno. Eu tenho esse hábito, e durante esse tempo extra, por sinal, conseguimos fazer um trabalho bem interessante. Ao longo dos anos tenho apoiado a participação de alunos nas olimpíadas de astronomia, física e matemática, e já obtivemos ótimos resultados, com diversos alunos medalhistas de ouro, prata e bronze. Temos também um aluno, Douglas Cardinot, que saiu do Nossa Senhora das Graças, estudou no Cefet e hoje integra o programa Ciência Sem Fronteiras lá na Espanha. Isso é um orgulho para a gente. É muito gratificante esse retorno que o aluno esforçado nos dá. É muito bom ver que o aluno segue uma carreira porque aproveitou um trabalho que tentamos fazer da melhor forma possível. Mas também é verdade que muita coisa desanima. O salário às vezes não compensa, e temos uma carga muito grande de trabalho. Vários de meus alunos já estão formados, vários estão entrando nas faculdades públicas cursando engenharia, medicina, direito... Mas infelizmente não tenho muitos alunos seguindo a carreira de professor, justamente pelos baixos salários.

Em sua opinião, qual a importância da atualização para um bom professor?
Veja bem, eu concluí minha primeira graduação na Faculdade de Filosofia Santa Dorotéia, e fiz a licenciatura plena em matemática, para poder lecionar no ensino médio. Mais tarde, em 2003, fiz uma especialização na UFF em ensino de física, e em 2013 me formei em física pelo Cefet. Atualmente estou cursando um mestrado da Sociedade Brasileira de Física, e também comecei o mestrado em engenharia, ciência e tecnologia dos materiais na Uerj, porque o professor tem que estar sempre se capacitando, sempre procurando alguma coisa diferente para aprender. É preciso estar sempre antenado a tudo o que está acontecendo, tudo que está mudando. Dar aula é um desafio. É desafiador porque é preciso estar sempre preparado para passar a informação mais precisa e atualizada ao aluno.

A sociedade científica celebra em 2015 os 100 anos da Teoria da Relatividade Geral. Como é o desafio de traduzir e ensinar conceitos tão complexos a alunos do ensino médio?
Apresentar a Física moderna ao aluno do ensino médio é vital para que ele possa entender como funcionam as coisas que o estão cercando. O telefone celular, a internet, a televisão de LCD... Todo esse equipamento que ele usa hoje é fruto de uma tecnologia nova, e a física está aí para explicar todo esse equipamento. Quando falamos da Teoria da Relatividade, do efeito fotoelétrico, a matemática envolvida é muita pesada. Acredito que o melhor caminho é trabalhar da forma mais conceitual possível, para que o aluno não fique perdido e perca o interesse. Tento passar o conceito para que eles entendam o que foi a Teoria da Relatividade, quanto tempo isso demorou, até para que possam compreender que uma pesquisa não se faz da noite para o dia. Passar todos esses conceitos para o aluno de ensino médio é um desafio, e faz parte da busca incessante para conseguir um ensino de qualidade, capaz de inserir o aluno em todas essas tecnologias, até para que ele possa opinar sobre o assunto. No fim ele pode não ser um especialista em fissão ou fusão nuclear, mas terá uma ideia bastante razoável sobre os conceitos, não será um analfabeto científico, e terá as ferramentas para poder seguir os estudos e compreender as informações que lhe forem passadas sobre o tema. Então ele vai poder formar a própria opinião e decidir o que lhe serve ou não. Essa, aliás, é a função do professor em sala de aula, independente da matéria ensinada. Fazer com que o aluno tenha conhecimento suficiente para fazer as próprias escolhas com consciência, e possa manifestar suas opiniões com embasamento, sem ser manipulado por ninguém.

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