Cordoeira: um bairro jogado às moscas, um ginásio entregue aos pombos

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014
por Ana Blue
Cordoeira: um bairro jogado às moscas, um ginásio entregue aos pombos
Cordoeira: um bairro jogado às moscas, um ginásio entregue aos pombos

As escadas que a equipe de redação subiu e desceu para coletar depoimentos e fotografar flagrantes de descaso no Cordoeira normalmente são destaque de outra seção do jornal: a policial. Tido como um bairro onde o tráfico de drogas é forte, por vezes esquece-se que ali moram famílias inteiras que clamam por atenção pública, em proporção igual ou até mesmo maior que diversas localidades do município. Gente que precisa de ônibus que atenda a contento a demanda local, com assiduidade. Que precisa contar com serviços básicos que funcionem. Que precisa ver subirem também opções de cultura, lazer e entretenimento — ou seja, algo além dos camburões policiais.

Ao que parece, segundo Dilza Lopes, de 52 anos e moradora do bairro há sete anos, serviços como o de abastecimento de água e distribuição de energia não são problema na localidade. A telefonia móvel, porém, deixa a desejar. "A gente precisa ir andando pela casa com o celular pra cima até achar sinal para telefonar”, diz Dilza, que reclamou também dos ônibus: "Não tem horário direito, nem do bairro para o Centro nem do Centro para o bairro”. Porém, o problema campeão para a moradora é outro: o ginásio — que fica praticamente de frente para a casa dela. 

Numa análise superficial, não há nada de tão grave na estrutura. O mato de frente aos portões está aparado, os próprios portões, inclusive, estão em bom estado. Só que Dilza expõe melhor a situação: "Aquelas calhas todas”, aponta ela, "enferrujaram e quebraram. Quando chove, a água fica toda empoçada naquele matagal ali e nas escadas” — a casa de Dilza fica em uma espécie de servidão, em uma escada que liga a Rua Darcília dos Santos à Rua Fernandes Ennes. No local há cerca de 20 casas — "Se você reparar lá em cima... o teto do ginásio está tomado pelos pombos. Imagina depois da chuva, a escada cheia de água empoçada, cocô de pombo, ferrugem, mato”, desabafa. Realmente não é uma imagem das melhores.

A redação procurou então Francesco José, de 34 anos, conhecido na localidade como Dedego — tido pela comunidade como o "prefeito do Cordoeira”. Ele corrobora as informações de Dilza e ainda acrescenta: "O matagal em torno do ginásio vai até o muro do colégio [Municipal Padre Rafael]. Então aqui está sempre cheio de bicho: rato, mosca, barata. Fora que as crianças do colégio nem podem usar o ginásio, pois este está sem luz, sem água, com o chão todo arrebentado. Não tem outras opções de lazer aqui, as crianças têm de brincar na rua, tendo um ginásio desse tamanho na porta de casa”. De fato, os jovens D.B, de 17 anos, Y.S, de 15, e J.B e D.S, ambos de 14 anos, jogavam bola na rua, em meio aos carros, no momento da reportagem. Dedego caminha alguns metros e mostra à nossa equipe um espaço com um escorregador e alguns brinquedos, que ele mesmo disponibilizou para as crianças. "É o que dá pra resolver”, diz o prefeito do Cordoeira.

O posto de saúde local é elogiado tanto por Dedego quanto por Dilza. Dilza afirma ser sempre bem atendida e Dedego informa que o posto passou a dar prioridade para os moradores do bairro — antes, a distribuição de fichas não levava isso em conta, atendendo a moradores de todas as localidades do município, conforme chegada. Há espaços bastante sujos pelas ruas, o que indica que a coleta de lixo possa não suprir a demanda da comunidade; no entanto, o problema não foi apontado como grave pelos entrevistados. 

A política de repressão ao tráfico de drogas é um assunto à parte e gera controvérsias. Se, por um lado, é preciso de fato fazer cumprir a lei — e nem sempre é possível realizar esta atividade por meios pacíficos — por outro, e talvez como consequência disso, a convivência entre comunidade e polícia militar se torna um tanto quanto difícil, e podem acontecer situações de constrangimento, como as abordagens policiais realizadas nas ruelas e escadões do bairro atrás de drogas, quando são revistados praticamente quaisquer adolescentes ou adultos jovens. Claro que nenhum morador reclamou a respeito: o tema nem sequer foi mencionado na entrevista. Entretanto, a redação de A VOZ DA SERRA recebeu recentemente o relato de um produtor cultural informando que praticamente todos os encontros realizados nas principais vias do bairro, como festas de rua e até programações infantis — iniciativas bancadas por instituições privadas e não públicas, ressalte-se — terminam a toque de caixa, por determinação de policiais militares.

Uma coisa é certa: seja qual for a nuance analisada, seja qual for o fator social que prejudique a qualidade de vida da população, é preciso olhar e cuidar desta, em prol principalmente das milhares de famílias que moram no bairro e contribuem para o crescimento político, social e econômico de Nova Friburgo.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS:
Publicidade