Engenho novo bota a roda pra rodar

quinta-feira, 05 de outubro de 2017

Engenho novo bota a roda pra rodar 

É sempre prazeroso escrever sobre o Engenho Central Laranjeiras. Há pouco tempo, fazendo uma incursão de pesquisa aos nossos sempre acolhedores municípios do Centro-Norte fluminense, parei no distrito de Laranjais, em Itaocara, para perguntar sobre o Engenho Central. Recebi com tristeza uma resposta que já imaginava. Não há nada funcionando no saudoso engenho. Vamos então a sua história. Os descendentes do Barão de Nova Friburgo, Antônio Clemente Pinto Filho e Bernardo Clemente Pinto Sobrinho estabeleceram uma sociedade com Elias Antônio de Moraes, o 2° Barão de Duas Barras, Galdino Antônio do Valle, Jacob van Erven, entre outros. Edificaram um engenho que centralizaria o beneficiamento da cana de açúcar de toda a região. 
Por volta de 1884, inauguraram na Fazenda das Laranjeiras, de propriedade dos primeiros sócios, a Companhia Engenho Central Rio Negro. No entanto, decorridos cinco anos de sua fundação, a empresa inicia um processo de falência sendo decretada a sua liquidação judicial. Em 1896, o coronel Luiz Corrêa da Rocha arrematou o engenho e passou a denominá-lo de Engenho Central Laranjeiras. O sucessor de Corrêa da Rocha foi o seu filho Péricles Corrêa da Rocha que administrou o engenho no período de 1930 a 1956. Advogado, prefeito duas vezes em Bom Jardim, deputado estadual e federal foi cassado na Revolução de 1930 e a partir de então, teve sua carreira política interrompida. Voltou-se para a administração do engenho modernizando-o com grande talento e tino comercial. Péricles substituiu as moendas primitivas ampliando em muito a capacidade de moagem da cana aumentando a produtividade do engenho. Adquiriu novas terras para o plantio da cana e endureceu a relação com os fornecedores desse produto. 
Além de ampliar a produção do engenho, diversificou os seus produtos, pois além do açúcar passou a fabricar éter e álcool farmacêutico. O Engenho Central investiu ainda em uma malha ferroviária conectada aos trilhos da companhia Leopoldina para facilitar o escoamento de sua produção. O Engenho Central Laranjeiras na gestão de Péricles chegou a ter 1.500 funcionários. Para tanto, Péricles fez o arruamento no entorno do Engenho Central, criando ruas e construindo residências ao redor da sede do engenho para habitação dos seus funcionários. A sociabilidade não foi esquecida. Um cinema foi construído em 1946, com 300 lugares, um clube social para os bailes e uma banda de música formada pelos mecânicos da usina. Foi construído também um hospital e uma farmácia. O Engenho Central Laranjeiras era totalmente autossuficiente. Possuía uma grande lavoura de inhame, mandioca, legumes, hortaliças, feijão e arroz. Criavam-se porcos e bois para o açougue e tudo era vendido aos funcionários dentro do próprio engenho. A autossuficiência era tamanha que além de confeccionarem o tecido do saco de açúcar, o algodão do saco era igualmente plantado nos arredores do engenho. 
A Casa da Moeda autorizou a emissão de uma moeda própria para circulação interna em Laranjais. Denominavam de “dinheiro próprio”. A administração do engenho pagava aos funcionários em dinheiro próprio que circulava, além de Laranjais, em municípios próximos. Em 1958, Álvaro Luiz Corrêa Graça adquiriu de seu tio Péricles o Engenho Central Laranjeiras. Era a quarta fase da gestão do engenho. Mas depois veio a crise do setor açucareiro. O governo militar interferiu na atividade açucareira, criou o IAA - Instituto do Açúcar e do Álcool - e passou a ditar regras. Deixou de haver o livre comércio e conseqüentemente ocorreu a falência de inúmeras usinas. Quando o Engenho Central encerrou suas atividades, muitos de seus funcionários foram trabalhar nas indústrias de Nova Friburgo, a exemplo das Rendas Arp, Ferragens Haga e metalúrgicas em geral. Era uma mão de obra especializada em fundição e mecânica. 
Em Nova Friburgo, quem tivesse registro na carteira de trabalho impresso Companhia Engenho Central Laranjeiras tinha emprego certo, em razão de sua boa formação profissional. Fica o registro da velha canção do saudoso engenho: “Engenho Novo, Engenho Novo, Engenho Novo bota roda pra rodar; capim melado, chip chip, mela mela, eu passei pela capela e vi dois padres a rezar.”

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    A Belle Époque da aristocracia açucareira fluminense

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    Carros de boi no transporte da cana de açúcar no Engenho Central Laranjeiras

  • Foto da galeria

    Residências dos funcionários do Engenho Central Laranjeiras

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Janaína Botelho

Janaína Botelho

História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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