Aedes aegypti: um velho conhecido em nossa história

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

O combate ao mosquito Aedes aegypti é um problema de saúde pública desde os primórdios da nossa história. No passado se denominava febre amarela e não dengue e as teses sobre a origem da doença eram ainda discutíveis no meio médico. Oswaldo Cruz foi o médico sanitarista chamado para conter essa e outras moléstias como a varíola e a peste bubônica que proliferavam no Rio de Janeiro, então capital da República. Em 1903, foi nomeado diretor geral da saúde pública e recebeu amplos poderes para sanar os problemas de saúde e higiene no Rio de Janeiro. Enquanto muitos médicos achavam que o contágio se dava através dos miasmas nos ares, secreções dos doentes ou contato com roupas, Oswaldo Cruz acreditava que a febre amarela se propagava através de um mosquito. Na ocasião, algumas teses nesse sentido já eram correntes entre alguns médicos e Oswaldo Cruz comungava dessa opinião.

O Rio de Janeiro era um porto maldito no início do século 20. A febre amarela, por ironia, fechava os portos que Dom João VI havia tão gentilmente aberto aos navios estrangeiros. Poucos navios ousavam tocar no Rio de Janeiro. O navio de guerra italiano Lombardia se aventurou a ancorar nesse porto em 1895 e perdeu 300 de seus 400 tripulantes. Para combater os focos de proliferação Oswaldo Cruz criou o Serviço de Profilaxia Específica da Febre Amarela e as brigadas de mata-mosquitos. Agentes sanitários munidos de larvicidas eram encarregados de eliminar as larvas do mosquito nos locais em que se desenvolviam.  Algumas medidas como a entrada dos agentes nas residências provocou revolta na população.

A medicina preventiva aplicada por Oswaldo Cruz estava em seus primórdios e era até mesmo questionada nos meios médicos. O jovem médico angariou a antipatia da população e de seus colegas. As charges nos jornais da época não poupavam ironia a Oswaldo Cruz. No entanto, ele tinha total apoio do presidente da República, Rodrigues Alves, e prosseguiu com força em sua campanha. Determinou a demolição de centenas de residências de madeira podre, consideradas insalubres e na ocasião esse fato ficou conhecido como o “bota abaixo”. A elite da época recorreu ao judiciário com habeas corpus preventivo alegando “inviolabilidade do lar” para evitar que os mata-mosquitos entrassem em suas residências.

Oswaldo Cruz corria contra o tempo e contra as notificações dos meirinhos da justiça. Os agentes mata-mosquitos eram frequentemente agredidos pela população. A vacina contra a varíola sendo obrigatória provocou a denominada revolta da vacina e ganhava as páginas da imprensa da época que estava a pleno vapor. Foi um período em que aumentou a circulação de periódicos por todo o país e a comunicação ganhou força. O resultado da campanha do sanitarista colheu seus frutos: A febre amarela teve um significativo retrocesso.

Em 1903, a febre amarela havia matado no Rio de Janeiro 469 pessoas, e no ano seguinte, 39 óbitos foram registrados. Em 1907, Oswaldo Cruz recebeu a medalha de ouro na exposição internacional de higiene de Berlim. No mesmo ano, o sanitarista enviou um comunicado a Afonso Penna, novo presidente da República, declarando que a febre amarela não era mais uma epidemia na capital do país. Fica uma pergunta: O que Nova Friburgo tem com toda essa história? Muita coisa.

O Rio de Janeiro foi uma cidade insalubre até a reforma empreendida pelo prefeito Pereira Passos em princípios do século 20. Era considerado o túmulo dos estrangeiros dando origem inclusive ao cemitério dos ingleses, que na ocasião, por conta das estradas de ferro, residiam em número significativo na cidade. Desde que Dom Pedro II perdera dois filhos vítimas da febre amarela a elite carioca simplesmente fugia da canícula da corte no verão e se refugiava em Petrópolis e igualmente em Nova Friburgo. Esses veranistas permaneciam todo o verão, daí o termo “veranista”, nessas cidades serranas fomentando a economia local. Eram seis meses em Nova Friburgo e isso trouxe uma mudança significativa no campo da sociabilidade pois os cariocas movimentavam a vida social na serra com representações teatrais, picnics e soirées.

Com o saneamento empreendido por Oswaldo Cruz esse afluxo de turistas reduziu significativamente, pois o Rio de Janeiro passou a ser uma cidade aprazível, com seus boulevards e cafés, livre das epidemias. Em contrapartida, Nova Friburgo deixou de viver a sua belle époque perdendo muito de seu turismo. 

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    O sanitarista Oswaldo Cruz (Cortesia: Janaína Botelho)

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    Os mata-mosquitos (Cortesia: Janaína Botelho)

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    Charge da época em que a doença não poupava a elite (Cortesia: Janaína Botelho)

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História e Memória

A professora e autora Janaína Botelho assina História e Memória de Nova Friburgo, todas as quintas, onde divide com os leitores de AVS os resultados de sua intensa pesquisa sobre os costumes e comportamentos da cidade e região desde o século XVIII.

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