Mudando paradigmas – A produção em série

quarta-feira, 04 de abril de 2018

A produção durante a era industrial chegou a um ponto importante na relação custo e trabalho, investimento e lucratividade. As peças eram repetidas. Surgiu a produção em série, que chegava a impedir que as pessoas pudessem escolher as cores dos produtos que compravam. Como se dizia à época de Henry Ford: “O cliente pode ter um carro da cor que desejar, contanto que seja preto.” Sai muito mais barato e não era necessário mudar todo o sistema de produção para mudar as cores das tintas. Então, cor de carro era preta.

Mas, nos jornais, a elaboração das edições também era assim: numa grande sala, cheia de mesas, um chefe tomava conta e todos trabalhavam. Era a visão do galpão da fábrica transportada para a redação do jornal. Por incrível que pareça, as salas dos lentes na Idade Média muitas vezes se distribuíam como um anfiteatro, mais aconchegantes que as salas que refletem a era das indústrias e máquinas. Também a sala de aula era a representação dos galpões. Os alunos deveriam olhar e ver o professor. Dos colegas, viam as nucas. Formavam-se em “nucologia”.

A fôrma tomou conta e despersonalizou a obra. O importante era repetir, fazer igual, nada de criatividade e de intuição. Mais tarde unificaram-se programas, tempos de aula e tempos ótimos para se construir ou manipular um material tendo em vista um produto. Esperava-se, assim, que as pessoas formadas em determinado núcleo de treinamento tivessem um comportamento idêntico às demais, porque os programas eram os mesmos, os períodos de aprendizado eram os mesmos, às vezes até os mestres eram os mesmos. Criou-se uma imagem de verdade na sociedade das máquinas em que o correto era produzir em série, cada um conforme sua especialidade.

As universidades e escolas desde cedo organizaram-se num sistema de produção, como se estivessem numa construção civil. Engendrou-se o sistema seriado, e as construções do saber assemelhavam-se a um edifício, em que um andar não poderia ser construído sem o imediatamente inferior. O ensino então foi centrado nos conteúdos deixando-se de lado a pessoa e seu desenvolvimento psicológico. Juntando-se à noção de um tempo absoluto, transportou-se o conceito de produção repetitiva para dentro dos centros de produção do saber. A consequência foi a quase eliminação da criatividade, a colocação da imaginação em segundo plano e a priorização dos mecanismos que desenvolviam a memória e esquemas mecânicos.

Muitos professores buscavam o sistema de criar “macetes” para que os alunos pudessem aprender, ou melhor, memorizar o que não era ensinado com significado. A pior coisa que pode acontecer a uma pessoa é fazer as coisas e não entender seu significado. Se diariamente uma pessoa é levada a transportar tijolos de um lado para o outro, sem saber o porquê, sem perceber o significado que está fazendo, isto enlouquece. Somos seres que necessitamos de significado para o que fazemos e aprendemos. Assim, na indústria de repetição, na produção em série, criamos uma sociedade de pessoas sem compreensão do significado de seus gestos, que apertam parafusos ou solucionam problemas de aritmética por intermédio de “macetes”.

Este exército de seres sem compreensão do mundo e da vida desembocou sem preparo na sociedade do conhecimento e não consegue recuperar o tempo perdido se os paradigmas não forem superados.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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