Falando sobre educação — Parte 2

quarta-feira, 02 de novembro de 2016

Todos são unânimes em afirmar que um país só atinge sua real capacidade de desenvolvimento através da educação. De que forma, então, podemos fazer isso? Jamais com a pergunta que ouvi numa cidade da Amazônia: “Professor, se todos aprenderem, quem trabalhará para a gente?” Trata-se de mentalidade anterior à abolição da escravatura. Temos de insistir para que, ao lado do pesado e barato (exploração de minérios) incrementemos a produção do leve e caro (um chip, por exemplo). Os produtos leves e caros, assim se apresentam porque adicionam tecnologia e refletem a formação dos profissionais que trabalham nessas indústrias. Quanto melhor a formação mais será possível agregar valor ao produto. Por esta razão, poucos trabalhando sustentarão grandes grupos de aposentados. 

Nós temos 25 anos para solucionar esta questão ou nos depararmos com o colapso de nossa economia, mesmo com grande exploração de petróleo. O Instituto de Previdência Social já estuda o impacto do óbito, no Brasil que ainda neste século pode chegar aos 120 anos! Basta imaginar o custo dessa previdência para avaliarmos o salto qualitativo da educação para fazer frente a ela. Portanto, não há mais lugar para gestores públicos colocarem entraves ao desenvolvimento da educação. 

Ficar contra concursos públicos, formação continuada de professores, avaliação institucional, condições dignas de trabalho e salário representa um atraso inconcebível.

Quando a educação passa a ser plano de governo o resultado nós conhecemos. Basta olhar para o Brasil. Somos avessos ao planejamento e, cada um ao ser eleito, sente-se um pequeno rei ou rainha para destruir o que a “dinastia” anterior fez. E, enquanto implanta o seu molde, o país gasta um dinheiro que poderia ser muito mais bem empregado. A educação sofre com essas mudanças e nem a Lei da Responsabilidade Fiscal conseguiu inibir estes comportamentos. Não temos continuidade por culpa de nossos princípios políticos. 

Em um município brasileiro, por exemplo, encontrei quatro professores lecionando sem concurso. Todos eram disléxicos. Trocavam a letra no quatro de giz e os alunos copiavam com a troca. Noutra cidade perguntei à secretária de educação se o profissional em questão era concursado. Ao saber que se tratava de mais um contratado conclui sobre o porquê de sua escrita, usando a letra “G” para grafar a palavra “hoje”. Os concursos não resolvem todos os problemas, mas podem ajudar muito!

A longa espera pelo PNE 

Os planos nacionais de educação são bastante discutidos, mas sua execução é demorada. Por exemplo, o último Plano Nacional de Educação (PNE) que deveria valer de 2011 a 2020 ainda não foi aprovado pelo Congresso Nacional. Este fato é uma prova inconteste que nossos representantes no legislativo não priorizam a educação. 

Há os que analisam de outro ângulo: para aprovar o que foi proposto pelo executivo teria que dar tempo ao tempo, inclusive para que o país tivesse como aplicar as verbas para a educação. A gravidade maior para este atraso é que não temos mais garantias de aprovação este ano e, após a aprovação, os estados e municípios terão mais um ano para fazer as adaptações. 

Vê-se, então, que este plano, na melhor das hipóteses chegará à ponta de nosso sistema educacional até 2026. Pelo menos 50% do tempo terão sido dedicados ao debate. Os propalados 10% do PIB aplicáveis à educação, como o legislativo federal votou, estarão plenamente aplicados somente em 2026. 

Até 2021 vamos nos contentar com 5% do PIB para a educação. O mais importante refere-se ao ritmo da caminhada. No passo atual, os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) só atingirão as metas propostas para 2022, em 2052. 

Por milagre, se tivermos uma aceleração após a aplicação plena do II PNE podemos atingir esta meta na metade deste século. Corresponde ao limite de tempo para não se perder outra geração de brasileiros com péssima educação, o que significa maior dificuldade de agregar valor aos produtos e conseguir melhor distribuição de renda. 

A permanecer este quadro, os menos favorecidos economicamente, só chegarão à universidade através de cotas porque não terão uma educação pública, gratuita e de qualidade como preconiza a Constituição Federal em vigor.

Continua na próxima quint-feira, 10.

Prof. Hamilton Werneck é pedagogo, escritor e palestrante. Escreve neste espaço agora às quintas-feiras

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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