500 anos da Reforma Protestante - Parte 2

terça-feira, 04 de julho de 2017

Outra estrutura necessária para que seja compreendida em que caldo cultural a reforma protestante surgiu era a organização dos reinos europeus onde, na verdade, o Papa era considerado como um verdadeiro príncipe, governando com uma estrutura monárquica como ocorre até nossos dias.

A teoria de Bossuet, do direito divino, ou seja, alguém governa porque Deus permite ou o quer, era a doutrina de justificativa do poder, conhecida séculos depois como a proposta árquica do poder, a ser questionada por outra, a estrutura télica, surgida com a revolução francesa. Enquanto uma observava a origem do poder, a outra, mirava a quem ele se destinava. Tal explicação encontra-se mais ampliada no livro O Argumento Liberal, de José Guilherme Merchior, diplomata, escritor e membro da Academia Brasileira de Letras.

Os reis e príncipes defendiam a ferro e fogo um dos pilares da segurança do reino, “uma religião”. Estes príncipes eram em grande parte parentes entre si, e muitas famílias europeias tinham príncipes civis, nobres em suas cortes, que eram eleitores oficiais do Papa. Quando acompanhamos, hoje, num conclave fechado na Capela Sistina, a eleição de um Papa, isto é feito pelos príncipes da Igreja, ou seja, pelos cardeais. Atualmente não há mais príncipes civis nas eleições papais. Na época de Lutero, havia.

Em cada reino, por sua vez, os bispos viviam na corte, muitas vezes originários de uma família real, e não eram encontrados nas suas dioceses. Foi o Concílio de Trento que determinou que cada Bispo deveria viver em sua diocese, como pode ser presenciado em qualquer diocese católica em nossos dias.

Conclui-se que os dirigentes da Igreja à época eram pessoas de origem nobre e, como tais viviam, recebendo inclusive, as benesses do reino. Também contra tal comportamento Lutero se rebela.

A língua da Igreja era o latim vulgar, responsável pela unificação europeia depois da queda do Império Romano, resultado de uma interligação do latim clássico com as várias línguas dos povos que invadiram o Império Romano. Mais tarde elas foram se dividindo, conservando a Europa, mesmo a anglo-saxônica, com muitas palavras em seu vocabulário que são de origem latina.

O povo pobre, na realidade, ficava à mercê dos cuidados do chamado “baixo clero”, por sua vez também pobre e sem títulos de nobreza.

Lutero questiona tudo isso como alguma coisa muito distante das propostas dos evangelhos de Jesus Cristo.

Como se vê, a eclosão do movimento de 31 de outubro de 1517, em pleno território alemão, abalou as estruturas da Igreja Católica, que se via ameaçada, inclusive, com a perda da hegemonia da interpretação da Bíblia porque Lutero trabalhou na tradução deste livro sagrado, para a língua alemã. Diria YuvalHarari em seu livro, Uma Breve História da Humanidade Sapiens, que no subjetivo de cada pessoa e no intersubjetivo começava a ser substituída a hermenêutica católica, por uma hermenêutica Luterana e tipicamente alemã. Lutero desenvolveu alguns importantes trabalhos escritos, dos quais destaco: a tradução da Bíblia para o alemão e outro livro sobre a Nobreza Cristã da Nação Alemã. Até nos meios eclesiásticos se diz que os alemães consideram na expressão latina que “asinusgermanus, doctorromanus est”, um asno alemão é um doutor romano. Lutero mexeu com este tipo de brio nacionalista. Assim, aos poucos, ficam sendo estabelecidas as bases para a compreensão deste movimento de divisão da cristandade, com reflexos até hoje.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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