Riquezas e pobrezas

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Sim, só pobre é que vai buscar pessoalmente, desde saco de cimento a vale refeição

Acabo de ser informado de que três americanos, os senhores Jeff Bezos, Bill Gates e Warren Buffett possuem uma fortuna que corresponde à grana de 160 milhões de pessoas. Ou seja, são mais ou menos ricos, donos da insignificância de 234 bilhões de dólares. Se fosse em real, já seria um dinheirinho razoável, mas, além de muito, é em dólar.

Para não ficarmos tristes, consta que pelo menos cinco brasileiros também não andam mal de vida. Jorge Paulo Lemann, Joseph Safra, Marcel Telles, Carlos Alberto Sucupira e Eduardo Saverin têm nos bolsos a nada desprezível quantia de 85 bilhões de dólares, o que é igual ao que possuem 103 milhões de seus compatriotas. Bem entendido: juntando tudo que têm esses 103 milhões, inclusive aquele cofrinho em que você bota as moedinhas que sobram no fim do mês.

Talvez daí alguém conclua que as coisas estão muito mal divididas neste mundo. Mas já me contaram a história de um empregado que foi reclamar do salário com o chefe, argumentando que, enquanto os trabalhadores brasileiros mal conseguiam pagar as contas, os patrões possuíam montanhas de dinheiro. Parece que o patrão não gostou do argumento – e talvez também não do tom de voz do reclamante, tanto que tomou uma atitude imediata.

- Concordo com o senhor, e vou fazer a minha parte para que essa injustiça seja corrigida. Meu patrimônio é de 160 milhões. Divididos por 160 milhões de trabalhadores, dá um real para cada um. Tirou uma moeda do bolso e acrescentou: Aqui está o um real que lhe cabe. Agora passe no escritório e acerte as contas, que o senhor está despedido.

Ser rico deve ser bom. Até dizem que dinheiro não traz felicidade, manda buscar. Sim, só pobre é que vai buscar pessoalmente, desde saco de cimento a vale refeição. Vejam os nossos grandes homens públicos, aos quais gentilmente amigos anônimos (embora conhecidos) oferecem malas de dinheiro (a troco de nada, só por amizade). Quem já viu um desses nobres senhores carregando mala? De dinheiro, então, muito menos, o que não impede que a doação chegue aos bolsos do feliz destinatário. Sim, os ricos não precisam procurar dinheiro, o dinheiro procura por eles.

Às vezes cometem algum exagerozinho. Por exemplo, em São Paulo há um restaurante que andou servindo um prato polvilhado de ouro. Para quem não entendeu, explico melhor. Não que fosse de ouro aquele objeto definido nos dicionários como “recipiente normalmente de louça, redondo e raso, em que se come ou se serve a comida”. Não! Era a própria comida que vinha coberta por uma leve camada daquele valioso tempero. Os fregueses suspiravam ao provar tamanha delícia, embora não houvesse delícia nenhuma, porque a cobertura amarela e brilhante não acrescentava nenhum sabor ou valor nutritivo à refeição. Mas era elegante, era rico. Era, para usar uma palavra que está na moda, um diferencial. Que houvesse e haja pobres e famintos do lado de fora, é realidade pela qual só Deus pode ser responsabilizado.

Ser rico não é pecado, ou pelo menos nem sempre é pecado. Mas há pessoas que, quanto mais enchem o bolso, mais esvaziam o coração. E ser indiferente ao sofrimento alheio é certamente o mais triste dos pecados e a maior das pobrezas.

TAGS:

Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.