Impressões — 28/05/2016

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Fábula

Amazonas – mulheres guerreiras da Capadócia, nas margens do rio Termodonte. Não admitiam jamais homens consigo, e somente os recebiam uma vez a cada ano, porém, logo os despediam, sendo para isto mesmo preciso que os tais antes matassem três dos seus inimigos. Aos filhos machos davam a morte, ou os aleijavam, e diligentemente criavam as filhas, as quais queimavam o peito direito, e a adestravam em atirar a seta. Tiveram grandes guerras com os seus vizinhos, e foram destruídas por Hércules, que lhes aprisionou a sua rainha.

(Dicionário da Fábula- traduzido por Chompré – com argumentos tirados da história poética – Ed. Garnier – Paris)

Linha do Tempo

"O sábio não é o homem que fornece as verdadeiras respostas; é o que formula as verdadeiras perguntas." 

Claude Lévi-Strauss

"Mestre não é quem sempre ensina, mas quem de repente aprende."

João Guimarães Rosa

Márcia Frazão – mulher, mãe. E bruxa

Carioca, 65 anos escritora, filósofa por formação (UFRJ), amante da natureza e bruxa por vocação. Assim pode ser definida Márcia Frazão, residente em Nova Friburgo, autora de 15 livros de sucesso sobre alquimia e nutrição. Por trás de uma voz suave esconde uma mulher vibrante que se define como “anarco-feminista, caótica, visionária, ensandecida, alucinada, caipira pós moderna, lunática e brasileira”. E também doida por Chet Baker.

Numa conversa informal pode-se perceber a clareza de raciocínio, fugindo ao estereótipo de bruxa que estamos acostumados a ler e ouvir falar. Não é má como pintam os filmes e a literatura de horror. É lúcida, crítica e preocupada com o futuro da humanidade, sem perder de vista o contato com as coisas simples da vida, como a paixão pela culinária, os livros, a música e os bons amigos. Descubra você também o que ela tem para nos dizer.   

Mitologias, simbologia, feitiços, bruxarias. É assim a sua vida?

M.F. - Na verdade, a minha concepção de "magia" engloba mitologia e simbologia. A figura da bruxa, ou seja, a mulher que vive à margem, que guarda a tradição, ou seja, a narrativa do mundo, nada mais é do que uma mulher que domina mitos e símbolos.

E o destino, onde fica?

Fica na curva do mais além do mais distante, mais aquém do ali e do acolá.

Mudou o mundo ou mudamos nós? Como você analisa a nossa contemporaneidade?

O mundo, enquanto espaço físico do "mesmo", esse não muda, o homem muda, mas nem sempre para melhor (o que estamos vendo agora). Quanto aos tempos atuais... parece que os deuses há muito picaram a mula e estamos entregues à insensatez dos tolos.

Retrocedemos? Avançamos? A intuição ainda tem vez na sociedade moderna?

Retroceder, avançar, dizem respeito a escolhas, infelizmente, grande parte da humanidade escolheu, optou, pelo obscurantismo reacionário de uma sociedade cuja sede de consumo leva a lugar algum. A intuição seria (é) nosso último vínculo com nosso espírito animal. Pena que poucos se abram para ela com a humildade de se reconhecer um igual a tudo que nos cerca.

O Brasil (e o mundo) vive um momento de crise, um contra o outro. Você acha que estamos desenvolvendo o ódio ao invés do amor?

Não sei se chamaria de ódio. Sinto que alienação, o descaso pelo outro é o sentimento geral. E sinceramente não vejo como o amor pode entrar na história/alma dessas pessoas. Sim, sou pessimista frente à história do homem.

Além de bruxa, escritora, dona de casa e mãe, você se perde entre panelas, a horta e receitas. Como é o seu lado gastronômico? A alimentação nos faz melhores?

Amo cozinhar, tornar do cru, cozido, salgar, adoçar, apimentar. Não há alquimia maior. Sim, a cozinha, o ato de cozinhar, nos conecta com os primeiros habitantes da terra, nos aproxima dos deuses e de todos seres místicos. Putz! Eu adoro cozinhar!

E o nosso cotidiano urbano? O que mudou, o que falta? Qual o seu olhar sobre Nova Friburgo?

Há anos não saio de casa, e pouco vejo a urbanidade. Continuo a amar Friburgo como a cidade que me acolheu, que testemunhou todo meu trajeto literário, mas optei por me retirar da vida pública, me recolher numa concha que às vezes ecoa músicas das décadas de 30, 40, 50, ou recitar Fernando Pessoa no meio da noite.

E a literatura?Quais são os seus projetos atualmente?

Quanto a projeto literário, tenho dois livros para escrever, um, "Mães não deviam morrer", sobre a morte de minha mãe, o vazio assustador que herdei, e "Uma cozinha quase judaica", sobre ter descoberto (via pesquisas genealógicas) que descendo de judeus por parte de pai. Essa descoberta foi um dos grandes presentes que recebi do Altíssimo.

Deixe para nós um recado de esperança...

Como recado, deixo só um : VIVAM. Ah, e se puderem, pintem no meu facebook.

A literatura de Márcia Frazão

"Quando o telefone tocou, eu já sabia que a Ossuda a tinha levado. Não foi preciso que ninguém me avisasse, a Senhora dos Ossos já sibilara no meu ouvido estranhas sílabas mescladas com chocalhos e uivos de vento. Sílabas brancas, assustadoramente brancas como ossos lavados; como presas de elefantes fantasmas a vagarem por Áfricas ancestrais. Não foi preciso nenhum atestado de óbito que atestasse o óbvio: ela se fora e não voltaria. Nunca mais.

Do extremo da linha telefônica, aflito, meu irmão dizia que ela dormira e se recusava a acordar. Onírica, morta, alheia a agonia ao redor, minha mãe se extinguira como um último cotoco de vela derretida em lágrimas de cera. Embrulhada, enroscada no cobertor, dormia o sono dos mortos, aliviada da carga da maternidade. E eu? Como carregaria o peso esmagador da ausência?

Será que ela não pensara que talvez eu não tivesse força para carregar tal carga? Será que não pensou que eu poderia tombar no meio do caminho – sombrio – que se descortinava à frente? Será que não se importou com a invalidez da minha súbita orfandade? Será que o sono da Ossuda diluíra o seu pensamento e a arquetipal responsabilidade materna? Não sei. Só sei que nunca um mero telefonema me soou tão metafísico e sombrio. Talvez por arte do doce atordoamento que só a metafísica traz, ou por pura birra, deixei o telefone de lado e me afundei na maciez lodosa da poltrona da sala.

Não, eu não queria saber dos detalhes, não queria saber quantas vezes meu irmão a chamou, quantas cutucadas deu, quanto tempo passou depois dela passar pela sala, entrar no quarto, deitar-se e passar para o lado de lá, o lado do Letes. Os detalhes pareciam bifes recém cortados, estirados gelados sobre o tampo da pia. Será que ela não se preocupou com o jantar? Toda mãe se preocupa com o jantar. Mas ela já não era mãe. Por ossudociência da Ossuda, virara um não- sei- quê que tanto atormenta os filósofos, se transformara numa não-coisa, numa não- realidade, num tico provável de existência..."

(Trecho de “Mães não deviam morrer”)

Receitas mágicas

Para melhorar financeiramente

Pegue uma caixinha comprida, de preferência, de madeira ou ferro, coloca bastante canela em pó, uma nota aberta de dinheiro e umas moedas. Deve-se guardar essa caixa num lugar onde você guarda suas bolsas e coisas que tenham relação com dinheiro. Fora isso, pode-se pegar uma outra nota, salpicar com canela e guardar sempre na carteira, nunca deixe ela ir embora. É importante que isso seja feito na lua crescente.

Para arranjar um novo amor

Uma das coisas mais legais é tomar um bom banho com água de pétalas de rosas tiradas de um jardim. Não vale usar as flores compradas em floricultura. A água de pétalas é preparada da seguinte maneira: ferva água, jogue as pétalas e coe. O importante é se banhar com a mistura sem se enxaguar ou secar com a tolha. Seque-se naturalmente.

Para a pessoa reconquistar um amor

Depois de tomar o banho de rosas que já ensinei, salpique o pó da canela como se fosse um talco. Faça tudo quando for encontrar o amado. Eu garanto, se não baixar o cara, baixa outro. Isso vai deixar você cheirosérrima e é o maior afrodisíaco.

Receita afrodisíaca

Um banho de semente de coentro é ótimo.

Para quem deseja se sair bem numa prova

Carregar um raminho de alecrim e deixar na mesa. O alecrim é bom para a memória, mas quero deixar bem claro que é preciso estudar também.

Para uma entrevista de emprego

Levar uma noz moscada na bolsa.

Bibliografia

Literatura para adultos

O Feitiço da lua

O Oráculo dos astros

Manual Mágico do amor

A panela de Afrodite

Amor se faz na cozinha

O gozo das feiticeiras

Revelações de uma bruxa

A cozinha da bruxa

Guadalupe e as bruxas

O caldeirão da prosperidade

Senhoras do Santíssimo Feminino

Literatura para crianças

A bruxa Vitalina

O dia em que a pracinha sumiu

O rei da sola

Ametista, a bruxa dentista 

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