Sem constrangimento

quinta-feira, 09 de junho de 2016

Para desespero de muitos e preocupação do governo (e vice-versa), a Procuradoria Geral da República, a Polícia Federal, o MP e o Judiciário Federal têm na mira agora a alta cúpula do PMDB.       

Aliás, os líderes destas quadrilhas disfarçadas de partidos políticos deveriam ser os primeiros a serem presos, não só do PMDB, mas do PSDB, PT, PP... praticamente todos, já que no Brasil, via de regra, os partidos não representam ideologias, mas grupos diferentes que só se preocupam em se apossar do poder. E dos cofres. De qualquer jeito.

Mas as prisões dos políticos, em si, não causam tanto espanto quanto as reações dos envolvidos. Quando entrevistados, fazem cara de indignados, como se não tivessem nenhuma culpa nessa interminável orgia com o dinheiro público, que eles vêm patrocinando há anos.      Qualquer um que não os conhecesse ou não soubesse a historia pregressa e presente de cada um deles, ficaria até sensibilizado com os veementes arroubos de repúdio frente às câmaras. Sarney brada aos quatro cantos que está perplexo, indignado e revoltado e que merece mais respeito. Jucá considera o seu pedido de prisão um absurdo. Delcídio se diz inocente e ingênuo. Renan considera a sua eventual prisão abusiva. Eduardo Cunha, rato-mor, vê com estranheza o "absurdo" pedido de prisão. Lula, ameaçado de prisão há tempos, pergunta "por que isso está acontecendo no Brasil? Qual culpa tem o governo, qual é a culpa que tem o PT?".

Dilma, que pediu pessoalmente dinheiro por fora a Odebrecht, diz que "querem condenar uma inocente". Aécio Neves, denunciado por nove em cada dez delatores, se diz "indignado, vítima de suspeições absurdas e que a reputação de pessoas sérias não pode ficar refém de interesses inconfessos". E ao falar de "pessoas sérias", ele está se referindo, pasme, a si mesmo.

Em conversas gravadas, a maioria deles se refere ao Janot como um canalha, bandido, com uma raiva que dá até a impressão de que eles são as vítimas da historia. Incrivelmente, eles parecem se achar honestos e a polícia que os prende é que não presta, numa demonstração de que a corrupção está a tal ponto institucionalizada neste país que os corruptos se acham no direito de ficar indignados por serem investigados.

Em meio a este caos institucional, um ministro do novo governo, Geddel Veira Lima, ainda diz que as prisões "não causam nenhum constrangimento". Como assim? Eu, que não tenho nada a ver com a historia, fico constrangido só por ser brasileiro. Como estes canalhas não se constrangem por estarem saqueando a nação, do alto de sua verborragia inútil, ternos ofensivos e desculpas jactantes? Que raio de país é esse?

Este é o Brasil dos políticos. Dos espertos. Dos pilantras. Dos bem nascidos. Dos canalhas. Dos caras de pau. Dos cínicos. Dos que não se envergonham de roubar um povo que morre por falta de recursos e ainda fazem beicinho de indignação para defender com unhas e dentes seu direito de continuar a roubalheira generalizada.

Este é o pais do povo omisso, acomodado, pacato, deitado eternamente em berço esplêndido, tranquilo à nona, ordeiro ao extremo beirando o irritante, covarde ao grau irreversível de pusilânime; brasileiros que debatem, se estressam e se irritam por bandidos, mas não se doem por pessoas de bem que são sacaneadas, vilipendiadas, exploradas e mortas por falta de respeito aos seus direitos, todos os dias, sob as minhas, as suas, as nossas vistas.

No meio dessa confusão, de tanto prender gente, a Polícia Federal se prendeu: o famoso japonês da Federal, presente em praticamente todas as prisões de políticos, foi enclausurado nesta semana. A Polícia Federal, por certo, já tem pronta a sua explicação, nos moldes do discurso político: "Não há nenhum constrangimento". Há sim. Muito. O país todo está constrangido com esse mar de lama. Só não reage.

Pelo menos a Polícia Federal tem crédito. Os políticos não. Vamos aguardar a próxima prisão. Melhor dormirem de sapatos, Dilma, Aécio, Lula. Sem constrangimento, claro.

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Alzimar Andrade

Alzimar Andrade

Alzimar Andrade é Analista Judiciário do Tribunal de Justiça, Diretor Geral do Sind-Justiça e escreve todas as quintas-feiras sobre tudo aquilo que envolve a justiça e a injustiça, nos tribunais e na vida...

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